Terra e existência em Gaza

Por Asad Haider, via ViewPoint Magazine, traduzido por Lara Apolonio Rossetto

[Na imagem: “Apoie a luta do povo palestino em Gaza contra a ocupação sionista.” “Apoie a luta heroica do povo palestino em Gaza contra a repressão israelense.”]

Durante os onze dias de brutal ataque israelense a Gaza1 – que foi apenas uma intensificação da devastação diária na vida palestina – eu recorri aos escritos do romancista e militante palestino Ghassan Kanafani. Em seu conto “Cartas de Gaza”, o narrador escreve ao seu amigo que foi para a Califórnia para se formar em engenharia. Ele lembra de quando Gaza foi atacada em 1948 pelas forças que viriam a se tornar o Estado de Israel; do quanto ele queria ir embora e deixar Gaza para trás, para se libertar da derrota. Mas algo enfraqueceu seu “entusiasmo pela fuga”. Antes que pudesse partir de vez, ele foi para o hospital visitar sua sobrinha de treze anos, Nadia, que pertencia à “geração que foi criada em meio à derrota e à expropriação de tal maneira que passou a considerar que uma vida feliz é um tipo de disfunção social”. Sua perna foi amputada, após Nadia se jogar em cima de seus irmãos e irmãs para protegê-los do bombardeio. Ela poderia ter se salvado, fugido, mas ela não o fez. Agora, ele também nunca irá partir. Assim, conta a seu amigo:

“Esse sentimento obscuro que você sentiu ao deixar Gaza, muito pequeno, precisa crescer e se tornar um abismo gigante dentro de você. Ele deve se expandir e você precisa buscá-lo para se encontrar, aqui, nos escombros da derrota. Eu não irei até você, mas você deve retornar a nós! Volte para aprender com a perna de Nadia, amputada desde o topo de sua coxa, o que a vida significa e o quanto vale a existência”.

Depois de ler essas palavras, fui lembrado das de Karl Marx, pronunciadas um século antes dessas, tanto em seu discurso em Londres, em dezembro de 1867, quanto em sua carta aos camaradas de Nova Iorque, em 1870, tratando em ambas da “questão irlandesa”. Um registro do discurso de Marx documentou sua fala de que a questão irlandesa “não é simplesmente uma questão de nacionalidade, mas uma questão de terra e de existência”. Já em sua carta, ele escreveu que “na Irlanda a questão da terra tem sido, até agora, a forma exclusiva da questão social, pois é uma questão de existência, de vida e morte, para a imensa maioria do povo irlandês; pois é, ao mesmo tempo, inseparável da questão nacional2.

Em outras palavras, existe uma relação fundamental entre terra e nação, entre vida e existência. O que Marx chamava de “a questão nacional” era um modo de pensar essa relação. Em sua análise da questão nacional no vindouro “Handbook of Marxism”, Gavin Walker aponta que Marx escrevia em uma época em que as nações se encontravam em fluxo radical – seus limites territoriais eram constantemente redefinidos, diferentes línguas constituíam maiorias e minorias nacionais e o imperialismo produzia um ordenamento hierárquico global. Nesse contexto, portanto, era muito claro para Marx que havia certa volatilidade na categoria de “nação”: era o ponto de contestação que poderia ser levado a direções reacionárias ou emancipatórias.

Em um estudo histórico do período entre 1936 e 19393, Kanafani apresentou uma análise marxista da questão nacional na Palestina, circunscrita pelas relações entre a liderança local reacionária, os regimes Árabes vizinhos e a aliança entre o imperialismo britânico e o sionismo. Para os palestinos que se encontravam sob o cerco dessa aliança, a questão nacional se tornou prioridade dentre as questões sociais, enquanto, simultaneamente, o antagonismo entre o imperialismo e as lideranças feudais-religiosas levaram ao apoio da classe dominante a um certo nível de luta revolucionária. O desenvolvimento do capitalismo deu-se de forma desigual, às custas do povo palestino. A aliança sionista-imperialista deste período, para Kanafani, não havia levado apenas à institucionalização da violência colonial e à derrota da classe trabalhadora palestina, como também “sabotou, com sucesso, o desenvolvimento de um movimento trabalhista judeu progressista e de uma irmandade proletária judaica-arábica”.

A pesquisa de Kanafani foi interrompida por uma bomba plantada em seu carro pelo Mossad4, em 19725, então temos que recorrer às suas obras de ficção para completar as lacunas dessa história. Em “A terra das laranjas tristes”, o narrador lembra de sua família fugindo da Palestina em 1948, refugiados como outras centenas de milhões de pessoas. Ele era muito novo para compreender, inicialmente, o que estava acontecendo, mas tudo ficou mais claro quando viu os adultos de sua família caírem aos prantos ao avistarem laranjas. Ele recorda o momento em que foram parados pela polícia, que confiscava as armas dos refugiados:

“Quando chegou nossa vez, eu vi os rifles e metralhadoras sobre a mesa e desviei meu olhar para a longa fila de caminhões entrando no Líbano, desaparecendo nas curvas da estrada e aumentando a distância entre eles mesmos e a terra das laranjas. Eu também derramei um mar de lágrimas”.

Algumas laranjeiras foram destruídas e outras foram apropriadas pelo Estado israelense. Esse símbolo da terra natal da Palestina se tornou um símbolo de expropriação, antes de se tornar um símbolo do Estado de Israel. A extirpação das árvores não é apenas um dos mais potentes símbolos da expropriação palestina, mas também de seus efeitos mais devastadores. Estima-se que 2,5 milhões de árvores frutíferas tenham sido arrancadas desde 1967 para construir as colônias israelenses.

É possível compreender perfeitamente porque Marx descreveu a questão nacional como uma questão de terra e de existência, pois este é o caso da Palestina. A agricultura palestina é boicotada pela contínua expropriação de terras por parte da expansão israelense; pelo descarte de lixo doméstico e industrial dessas colônias em terras palestinas; pelas restrições na importação de insumos agrícolas e pela dependência na importação de bens de consumo israelenses; pelo controle do Estado de Israel sobre a água e a eletricidade; e pela destruição da infraestrutura de transporte pelas bombas de Israel.

Segundo o jornal Haaretz6, 99% da água potável de Gaza já era imprópria para consumo devido à contaminação do esgoto ou de níveis de salinidade elevados. O bombardeio recente destruiu sistemas de esgoto e fechou uma importante usina de dessalinização7. Um relatório das Nações Unidas8, em 2020, mostrou que Gaza tem “a maior taxa de desemprego do mundo e mais da metade de sua população vive abaixo da linha da pobreza”. O bombardeio recente em Gaza deixou mais de 10.000 pessoas sem casa, desapropriadas9.

Deveria ser muito claro que o caráter econômico da opressão palestina é inseparável de seu caráter nacional. Nós poderíamos incorrer em uma análise social do colonialismo israelense e o apoio do imperialismo americano, que demonstraria o papel estruturante da acumulação capitalista global. Mas isso não deveria encobrir o caráter relativamente autônomo da opressão nacional. As atrocidades cometidas por Israel são uma forma de terrorismo que pretende torturar, intimidar e humilhar palestinos, precisamente porque são palestinos. A ocupação que está em curso segue uma lógica niilista, que destrói e polui as terras palestinas, ameaçando a própria existência dos trabalhadores palestinos, que Israel deseja não apenas explorar, mas aniquilar, porque são palestinos. É a tentativa de destruir completamente qualquer coisa que se aproxime do controle palestino sobre sua terra e existência.

Esses temas estiveram profundamente presentes na análise de Marx sobre a questão nacional. É preciso notar que, para Marx, a questão nacional não estava, de modo algum, separada de questões que supostamente seriam puramente econômicas, nem subordinada a elas. Na verdade, Marx tinha acabado de apresentar (alguns meses antes) sua crítica sistemática à economia política no primeiro volume de O Capital, passando a ocupar-se completamente da questão irlandesa, não apenas em sua pesquisa, como também em suas intervenções políticas. Ele se posicionou incessantemente contra as influências do colonialismo na Internacional e se envolveu em campanhas em defesa dos prisioneiros políticos irlandeses depois do Movimento dos Fenianos10, uma tentativa fracassada de formar uma insurreição armada contra a dominação colonial inglesa, que ocorrera três anos antes, na Irlanda. Em suas cartas, Marx e Engels criticavam os fenianos pela incoerência de sua ideologia política e pelo caráter inconsequente e destrutivo de seus bombardeios. Entretanto, nunca expressaram suas críticas publicamente. As razões para tal foram expressas nos escritos de Marx sobre a questão irlandesa.

As condições impostas à Irlanda, relatadas longamente por Marx em O Capital e em seus discursos e cartas subsequentes, são um tanto familiares: despejo, expropriação, dispersão, expulsão das terras, salários baixos, desemprego, fome. Esse era o caráter econômico da questão nacional. Mas Marx também continuou insistindo no seu caráter fundamentalmente político. Ele escreveu para Engels, em 1869, que mesmo que ele tivesse, anteriormente, acreditado que a ascensão da classe trabalhadora inglesa possibilitaria a derrubada da dominação colonial na Irlanda, pesquisas mais aprofundadas o convenceram que o oposto era verdade. Ele, agora, concluía que a independência irlandesa era de “interesse direto e absoluto da classe trabalhadora inglesa” e que, sem ela, eles “nunca iriam conseguir nada”: “a alavanca deve ser puxada na Irlanda”. Utilizando mais uma imagem mecânica em 187011, ele descreveu a Irlanda como o “ponto mais fraco” da Inglaterra – um termo que antecipa as teorias posteriores sobre a Revolução Russa como o “elo mais fraco da corrente imperialista”12.

A primeira razão para o posicionamento de Marx era que a dominação das classes dominantes inglesas sobre a Irlanda mantinha não apenas a sua riqueza, como também a sua dominação sobre a própria Inglaterra. Se a polícia e o exército ingleses se retirassem da Irlanda, haveria imediatamente uma revolução agrária, que levaria à queda da aristocracia fundiária na Inglaterra. Os capitalistas ingleses se beneficiavam da importação de carne e lã baratas para o mercado inglês e tinha interesse na redução da população irlandesa através de seu despejo e de sua emigração forçada para que fosse possível investir em suas terras com “segurança”. Além disso, o lucro enviado da Irlanda para a Inglaterra reduzia os salários dos trabalhadores ingleses.

Mas “o mais importante de tudo”, escrevia Marx, era que a classe trabalhadora inglesa havia sido dividida em “dois campos hostis”. Os trabalhadores ingleses viam os irlandeses como competidores que diminuíam seu padrão de vida; eles se consideravam membros da nação dominante, transformando-se em armas para aristocratas e capitalistas contra a Irlanda e reforçando a dominação sobre si mesmos. Marx comparava os preconceitos religiosos, sociais e nacionais dos trabalhadores ingleses com o racismo dos “brancos pobres” dos Estados Unidos13. Os trabalhadores irlandeses, por outro lado, viam os trabalhadores ingleses como cúmplices da dominação inglesa na Irlanda e esse antagonismo foi “mantido artificialmente e intensificado pela imprensa, pelo púlpito e pelos jornais satíricos”, ou seja, pelo que passou a ser chamado de aparelhos ideológicos do Estado. Ele escreveu: “Este antagonismo é o segredo da impotência da classe trabalhadora inglesa, apesar de sua organização. É o segredo de como a classe capitalista mantém seu poder”. A tarefa mais importante da internacional era a de levar a cabo uma revolução social na Inglaterra, porque ela era “o único país em que as condições materiais para essa revolução atingiram certo nível de maturidade”. Mas a única forma de fazê-lo era através da conquista da independência da Irlanda. Portanto, era “dever da Internacional, por toda a parte, colocar em primeiro plano o conflito entre Inglaterra e Irlanda e aliar-se abertamente, em todos os momentos, com a Irlanda”, para que “os trabalhadores ingleses percebam que para eles a emancipação da Irlanda não é uma questão de justiça abstrata ou de um sentimento humanitário, mas a condição primeira de sua própria emancipação social”.

Gostaria de observar que Marx expõe dois argumentos a favor do caráter universal da emancipação irlandesa, objetiva e subjetivamente. Em primeiro lugar, ele apresenta uma análise social objetiva, que se apoia sob a premissa de que o nível de maturidade máxima do desenvolvimento capitalista oferece as condições materiais para a revolução. Ainda que este seja o caso, a evolução do processo material objetivo não é linear, pois não é a contradição entre capital e trabalho que inicia a revolução social, mas a contradição entre o colonialismo e a independência nacional. A análise objetiva do colonialismo demonstra não apenas que existe um processo não-linear, mas também que o que parece ser a contradição geral não existe em estado puro. As condições para a revolução são, na verdade, uma acumulação de contradições, que se fundem de tal modo que possibilitam uma ruptura revolucionária.

Isso significa que, especificamente, essas formas e circunstâncias historicamente concretas formam o locus da intervenção subjetiva. Essa é a minha leitura da análise de Marx sobre o antagonismo interno à classe trabalhadora. Também é possível interpretá-la como uma versão da teoria sobre a relação direta entre raça e classe, ou entre racismo e capitalismo. Essa é certamente uma questão interessante, mas tão importante quanto ela é a busca de Marx, aqui, em descrever porque a classe trabalhadora não tem força nem poder apesar de sua organização. Em outras palavras, é possível para a classe trabalhadora se organizar e ser organizada por organizações da luta de classes dentro das condições materiais mais maduras para a revolução e, ainda assim, não constituir um sujeito revolucionário. O sujeito revolucionário não existe a priori; não é simplesmente a classe trabalhadora, como uma categoria sociológica objetiva. O sujeito revolucionário deve ser construído politicamente e isso significa que a questão nacional é a condição política do sujeito revolucionário. Essa condição política, todavia, oferece uma pista para o caráter universal da luta, para além da sua relevância direta no caso da luta de classes na Inglaterra.

Obviamente, a análise historicamente específica de Marx sobre o colonialismo inglês na Irlanda e a composição da classe trabalhadora não pode simplesmente ser transplantada para cada forma de ocupação e de divisão identitária. Ele percebeu, em sua conjuntura, que era necessário superar a hostilidade e desconfiança mútuas entre os diferentes setores das massas trabalhadoras, assim como promover uma “desidentificação” com a nação dominante, algo que requer um comprometimento firme e abrangente com a emancipação anticolonial. Mas essas conclusões baseavam-se na análise concreta de uma situação concreta, que é precisamente o que deve ser feito atualmente. Não precisamos determinar antecipadamente que a Palestina é o ponto mais fraco no capitalismo global, que sua libertação seria a alavanca para uma revolução global ou que o antagonismo ente os palestinos e israelenses é o segredo da impotência da classe trabalhadora e do poder capitalista, para que possamos compreender a universalidade da causa palestina. A relevância permanente do engajamento de Marx é fruto de sua defesa de uma política emancipatória ligada à questão nacional. A importância dessa defesa fica clara quando consideramos que mesmo antes da última leva de bombardeios, o chefe dos direitos humanos das Nações Unidas disse que os habitantes de Gaza estão “enjaulados em uma favela tóxica desde o nascimento até a morte, desprovidos de dignidade, desumanizados pelas autoridades israelenses de tal maneira que parece que os oficiais nem consideram que esses homens e mulheres possuem algum direito ou razão para protestar”14.

Curiosamente, isso aponta para uma tensão presente na concepção de Marx sobre o processo revolucionário, ilustrada na relação entre a maturidade das condições materiais e o ponto mais fraco. Na análise de Marx, o nível máximo do desenvolvimento capitalista, na verdade, gerou uma situação em que a luta por libertação nacional passou ter prioridade na luta de classes. A própria independência nacional se tornou uma condição política para a revolução. A lógica de Marx do ponto mais fraco mostra que o processo revolucionário não é predeterminado e sua análise da questão nacional mostra que há uma dimensão irredutivelmente política. O que isso significa é que não haverá apenas uma luta, mas também que as diversas lutas possuem um caráter universal. Marx aponta nessa direção quando argumenta que a emancipação nacional é uma condição da emancipação social. Mas se nós defendermos que o processo revolucionário não segue um curso pré-determinado e que possui condicionamentos políticos, então a universalidade de uma luta não é determinada pelo fato de ser ou não a “alavanca” da revolução: situações diferentes, alavancas distintas. Essas lutas são universais por conta de seu próprio caráter emancipatório: porque colocam em jogo um princípio de justiça que atravessa situações locais e se aplica a todos. Esse princípio, mesmo que seja fruto de uma situação local específica, é antagônico a todo o sistema que gera e regenera a dominação e a exploração. Qualquer luta emancipatória precisa andar em direção à destruição desse sistema e à invenção de formas de vida novas, racionais e igualitárias.

Essa não é uma justiça abstrata ou uma lógica humanitária, que olha para a situação colonial e demanda o fim do ódio e da violência, uma variante humanista das formulações comuns da mídia hegemônica, que conecta as mortes dos palestinos ao “conflito” e não ao exército israelense. Nessa situação colonial, a luta por emancipação universal é necessariamente a luta pela autodeterminação da Palestina.

Em sua última entrevista15, Kanafani disse que era precisamente a dimensão universal da situação palestina que ele queria representar: “Não há um evento no mundo que não seja representado pela tragédia palestina. Quando eu retrato o sofrimento dos palestinos, estou, na verdade, utilizando os palestinos como um símbolo da miséria no mundo todo”. Mas como mostra “Cartas de Gaza”, não foi retratado apenas o sofrimento dos palestinos, mas também aquele comprometimento rebelde à vida e à existência, a recusa da fuga. Quando o narrador deixa sua sobrinha no hospital, ele é transformado pela coragem e pelo sacrifício da pequena. A Gaza da derrota e da expropriação se torna “algo novo. Parecia ser apenas um começo”.

Que nós também deixemos a rebeldia e a perseverança do povo palestino nos transformar. Este é o começo da política.


APÊNDICE 1 – Discurso de Karl Marx: “Sobre a Questão Irlandesa”

Disponível em: https://www.marxists.org/archive/marx/iwma/documents/1867/irish-speech.htm.

Fonte: MECW Volume 21, p.317.

Primeira publicação: Marx e Engels, “Obras Selecionadas”, segunda edição russa, 1960.

Este registro do discurso de Marx sobre a questão irlandesa em 16 de dezembro de 1867 foi realizado por Eccarius, com a intenção de publicá-lo no jornal Der Vorbote. O texto foi enviado por Friedrich Lessner a Johann Philipp Becker na Suíça, ainda sem ser publicado. O registro do discurso de Marx foi publicado em inglês na obra “Ireland and the Irish Question”, de Marx e Engels, pela editora “Publish Publishers” em Moscou, em 1971.

À Sociedade Educacional dos Trabalhadores Alemães em Londres

em 16 de Dezembro de 1867

Em 16 de dezembro, Karl Marx fez uma palestra para a Sociedade Educacional dos Trabalhadores Alemães de Londres sobre as condições na Irlanda, em que mostrava que todas as tentativas de anglicizar a população irlandesa nos últimos séculos terminaram em fracasso. Os ingleses, incluindo os aristocratas, que imigraram depois da Reforma16 se transformaram em irlandeses, por conta de suas esposas irlandesas, e seus descendentes lutaram contra a Inglaterra. A brutalidade da guerra contra os irlandeses sob o reinado da Rainha Elizabeth, a destruição de plantações e o deslocamento constante da população de um lugar ao outro para abrir espaço aos colonos ingleses não mudou nada nesse respeito. Naquela época, o cavalheiro e o comerciante aventureiro recebiam grandes pedaços de terra sob a condição de que estas seriam colonizadas por ingleses. No tempo de Cromwell, os descendentes desses colonos lutaram com os irlandeses contra os ingleses. Cromwell vendeu muitos deles nas Índias Ocidentais como escravos. Sob a Restauração17, a Irlanda recebeu muitos favores. Sob William III, subiu ao poder uma classe que só queria fazer dinheiro e a indústria irlandesa foi suprimida para forçar os irlandeses a vender sua matéria-prima para a Inglaterra por qualquer preço. Com a ajuda das Leis Penais Protestantes18, os novos aristocratas receberam carta branca sob a Rainha Ana. O parlamento irlandês19 era um instrumento de opressão. Católicos não podiam integrar o governo, nem ser proprietários de terra e ser um bispo católico era considerado uma traição de alto calibre. Essas proibições eram formas de roubar dos irlandeses de suas terras; mesmo assim, metade dos descendentes ingleses em Ulster se mantiveram católicos. As pessoas eram levadas aos braços do clero católico, que, assim, tornou-se poderoso. Tudo que o governo inglês conseguiu fazer foi implantar uma aristocracia na Irlanda. As cidades construídas pelos ingleses tornaram-se irlandesas. É por isso que existem tantos ingleses entre os fenianos.

Durante a Guerra de Independência Americana a dominação afrouxou-se um pouco. Outras concessões tiveram que ser garantidas durante a Revolução Francesa. A Irlanda ascendeu tão rapidamente que seu povo ameaçava ultrapassar os ingleses. O governo inglês levou-os à rebelião e impuseram a União20 com subornos. A União deu o golpe de misericórdia na tentativa de restabelecer a indústria irlandesa. Em certa ocasião, Meagher disse: todos os setores da indústria foram destruídos, tudo que nos resta é a fabricação de caixões. A propriedade de terras tornou-se uma necessidade vital; os grandes proprietários de terra alugavam suas terras a especuladores; a terra passava por quatro ou cinco arrendamentos antes de chegar os camponeses e isso fez dos preços desproporcionalmente altos. A população agrária vivia só de batata e água; trigo e carne eram enviados à Inglaterra; o aluguel diminuiu em Londres, Paris e Florença. Em 1836, £7.000.000 foram enviadas para o estrangeiro a proprietários de terra ausentes. Fertilizantes eram exportados junto dos produtos e dos aluguéis e a terra foi exaurida. A fome se instaurava aqui e ali e devido a uma infestação na safra de batatas houve uma fome geral em 1846. Um milhão de pessoas morreram de fome. A infestação das batatas foi resultado da exaustão do solo, foi um produto da dominação inglesa.

Devido à revogação das Leis dos Cereais, a Irlanda perdeu seu monopólio sob o mercado inglês, o velho aluguel não podia mais ser pago. Os preços altos da carne e a falência dos pequenos proprietários de terra restantes contribuiu ainda mais para o despejo de pequenos camponeses e à transformação de suas terras em pastagens de ovelha. Mais de meio milhão de acres de terra arável não são cultivadas desde 1860. A produção por acre diminuiu: a de aveia caiu 16%; a de linhaça, 36%; a de batatas, 50%. Atualmente apenas a aveia é cultivada para o mercado inglês e o trigo é importado.

Com a exaustão do solo, a população se deteriora fisicamente. Há um aumento absoluto no número de aleijados, cegos, surdos, mudos e loucos na população, cada vez menor.

Mais de 1.100.000 pessoas foram substituídas por 9.600.000 ovelhas, uma situação inédita na Europa. Os Russos substituem poloneses por russos, não por ovelhas. Apenas sob o domínio Mongol, na China, discutiu-se se cidades deveriam ser destruídas para abrir espaço para ovelhas.

A questão irlandesa é, portanto, não simplesmente uma questão de nacionalidade, mas uma questão de terra e de existência. Ruína ou revolução é a palavra do dia; todos os irlandeses estão convencidos de que se algo for acontecer, deve ser logo. Os ingleses deveriam exigir a separação e deixar os irlandeses decidirem por conta própria a questão da propriedade de terra. Qualquer outra ação seria inútil. Se isso não acontecer, a emigração irlandesa rapidamente levará à guerra com a América. Atualmente, a dominação da Irlanda é a coleta de aluguel para a aristocracia inglesa.


APÊNDICE II – Carta de Marx a Sigfrid Meyer e August Vogt em Nova Iorque

Disponível em: https://www.marxists.org/archive/marx/works/1870/letters/70_04_09.htm.

Fonte: “Karl Marx and Friederich Engels Selected Correspondence”. Progress Publishers, 1975, p.220-224.

Escrita em: 9 de abril de 1870.

Transcrita por: Rick Kuhn.

Londres, 9 de abril de 1870

… Depois de amanhã (11 de abril) eu enviarei a vocês quaisquer documentos da Internacional que eu tiver em mãos (está muito tarde para enviá-las ainda hoje). Também irei enviá-los mais um pouco de Basiléia [relatórios]21.

Dentre os materiais enviados, vocês encontrarão diversas cópias das resoluções do Conselho Geral do dia 30 de Novembro sobre a anistia irlandesa, resoluções que vocês já conhecem e que foram iniciadas por mim, assim como um panfleto irlandês sobre o tratamento dos fenianos condenados.

Eu pretendia mandar outras propostas sobre a transformação necessária da União (ou seja, da escravização da Irlanda inserindo-a em uma federação livre e igual junto da Grã-Bretanha). Por hora, suspendi maiores desenvolvimentos no assunto bem como resoluções públicas por conta de minha ausência forçada do Conselho Geral. Nenhum outro membro possui conhecimento suficiente sobre a questão irlandesa nem o prestígio adequado com os membros ingleses para poder me substituir nesse respeito.

Entretanto, o tempo não será perdido e eu te peço para prestar uma atenção especial aos seguintes pontos:

Depois de estudar a questão irlandesa por muitos anos, cheguei à conclusão de que o golpe decisivo contra as classes dominantes inglesas (e será decisivo para o movimento dos trabalhadores do mundo todo) não pode ser realizado na Inglaterra, mas apenas na Irlanda.

Em 1 de janeiro de 187022, o Conselho Geral emitiu uma circular confidencial feita por mim, escrita em francês (pois apenas os jornais franceses, e não os alemães, geram uma repercussão importante na Inglaterra) sobre a relação da luta nacional irlandesa com a emancipação da classe trabalhadora e, portanto, sobre a atitude que a Internacional deve tomar com relação à questão irlandesa23.

Irei expor, aqui, apenas alguns dos pontos mais salientes.

A Irlanda é o baluarte da aristocracia fundiária inglesa. A exploração desse país não é apenas uma das maiores fontes de sua riqueza material, como também sua maior força moral. De fato, eles representam a dominação sobre a Irlanda. A Irlanda é, portanto, o ponto cardeal para que a aristocracia inglesa mantenha sua dominação da própria Inglaterra.

Se, por outro lado, o exército inglês e a política se retirassem da Irlanda amanhã, haveria simultaneamente uma revolução agrária na Irlanda. Mas a queda da aristocracia inglesa na Irlanda pressupõe e tem como consequência necessária sua queda na Inglaterra. Isso iria oferecer a condição preliminar para a revolução proletária na Inglaterra. A destruição da aristocracia fundiária na Irlanda é uma operação infinitamente mais fácil do que dentro da própria Inglaterra, porque na Irlanda a questão da terra tem sido, até agora, a forma exclusiva da questão social, pois é uma questão de existência, de vida e morte, para a imensa maioria do povo irlandês; pois é, ao mesmo tempo, inseparável da questão nacional. Muito distante do fato de que o irlandês tem um caráter muito mais apaixonado e revolucionário do que o inglês.

Já no caso da burguesia inglesa, há um interesse comum com a aristocracia inglesa em tornar a Irlanda mera terra de pastagem, fornecendo ao mercado inglês carne e lã com os menores preços possíveis. Também está interessada em reduzir a população irlandesa, através de despejos e emigrações forçadas, a um nível tão pequeno que o capital inglês (capital investido em terras arrendadas para o cultivo) pode lá funcionar com “segurança”. Ela tem o mesmo interesse em liberar as propriedades da Irlanda como o fez nos distritos agricultores da Inglaterra e da Escócia. As £6.000 – 10.000 dos proprietários de terras ausentes junto de outros rendimentos irlandeses que escoam até Londres também devem ser levadas em conta.

Mas a burguesia inglesa também possui interesses muito mais importantes na economia da Irlanda atual. Devendo à crescente concentração de arrendamentos, a Irlanda constantemente envia seu próprio lucro para o mercado de trabalho inglês e, assim, faz cair os salários e prejudica a posição material e moral da classe trabalhadora inglesa.

E o mais importante de tudo! Agora todo o centro industrial e comercial na Inglaterra possui uma classe trabalhadora dividida em dois campos hostis: proletários ingleses e proletários irlandeses. O trabalhador inglês comum odeia o trabalhador irlandês pois o enxerga como um competidor que abaixa seu padrão de vida. Comparando-se ao trabalhador irlandês, ele se considera como um membro da nação dominante e consequentemente se torna uma arma para os aristocratas e capitalistas contra a Irlanda, fortalecendo a dominação sobre si mesmos. Ele nutre preconceitos religiosos, sociais e nacionais contra o trabalhador irlandês. Sua atitude em relação a ele é muito parecida com aquela dos “brancos pobres” com os negros nos antigos estados escravagistas dos EUA. O irlandês revida com interesse no seu próprio dinheiro. Ele enxerga no trabalhador inglês tanto o papel de cúmplice quanto de arma ignorante da dominação inglesa na Irlanda.

Esse antagonismo é mantido artificialmente e intensificado pela mídia, pelo púlpito, pelos jornais satíricos, enfim, por todos os meios disponíveis às classes dominantes. Este antagonismo é o segredo da impotência da classe trabalhadora inglesa, apesar de sua organização. É o segredo de como a classe capitalista mantém seu poder. E esta última sabe muito bem disso.

Mas o mal não para por aí e atravessa o oceano. O antagonismo entre ingleses e irlandeses é a base oculta do conflito entre os Estados Unidos e a Inglaterra. Ele faz com que qualquer cooperação séria e honesta entre as classes trabalhadoras seja impossível. Ele permite que os governos dos dois países, sempre que quiserem, incitar o conflito social por meio de seu bullying recíproco e, caso seja necessário, através da guerra entre os dois países.

A Inglaterra, metrópole do capital, o poder que, até agora, domina o mercado mundial, é, atualmente, o país mais importante para a revolução dos trabalhadores, bem como o único país em que as condições materiais para essa revolução atingiram certo nível de maturidade. É, consequentemente, de extrema importância que a Associação Internacional dos Trabalhadores acelere a revolução social na Inglaterra. O único meio de fazê-lo é através da independência da Irlanda. Por isso, é dever da Internacional, por toda a parte, colocar em primeiro plano o conflito entre Inglaterra e Irlanda e aliar-se abertamente, em todos os momentos, com a Irlanda. A tarefa especial do Conselho Central é fazer com que os trabalhadores ingleses percebam que para eles a emancipação da Irlanda não é uma questão de justiça abstrata ou de um sentimento humanitário, mas a condição primeira de sua própria emancipação social.

Estes são, de maneira geral, os pontos principais da carta circular, que, portanto, simultaneamente oferece as raisons d’etre das resoluções passadas pelo Conselho Central sobre a anistia irlandesa. Um pouco depois, mandei um artigo anônimo incisivo 24 sobre o tratamento dos fenianos pelos ingleses, etc., atacando Gladston, etc., para a Internacionale (órgão do nosso Comitê Central Belga25 em Bruxelas). Nesse artigo eu também denunciei os republicanos franceses (o Marseillaise publicou um texto sem sentido sobre a Irlanda escrito aqui pelo desprezível Talandier) porque, em seu egoísmo nacional, estão guardando toda a sua fúria para o Império.

E isso deu certo. Minha filha Jenny escreveu uma série de artigos para o Marseillaise, assinando-os como J. Williams (ela havia se apresentado como Jenny Williams em sua carta ao corpo editorial) e publicou, dentre outras coisas, a carta de O’Donavan Rossa. Por isso o burburinho absurdo.

Depois de muito tempo recusando cinicamente, Gladstone foi finalmente obrigado a concordar com um inquérito parlamentar sobre o tratamento dos prisioneiros fenianos. Jenny é, agora, a correspondente regular sobre a questão irlandesa para o Marseillaise (isso é, obviamente, um segredo que fica apenas entre nós). O governo e a imprensa britânica estão furiosos porque a questão irlandesa foi, agora, colocada na agenda na França e agora eles estão sendo vigiados e expostos através de Paris para todo o continente.

Matamos mais um coelho com a mesma cajadada e forçamos os líderes irlandeses, jornalistas, etc., de Dublin a entrar em contato conosco, algo que o Conselho Geral foi incapaz de fazer!”

Vocês possuem muitas oportunidades para fazer o mesmo na America. A coalisão dos trabalhadores alemães com os trabalhadores irlandeses (e, claro, também com os trabalhadores ingleses e americanos que estiverem preparados a aderí-la) é a maior conquista que vocês podem ter atualmente. Isso deve ser feito em nome da Internacional. A importância social da questão irlandesa deve ser clara.

Da próxima vez, farei alguns comentários especialmente sobre a posição dos trabalhadores ingleses.

Saudações fraternas!
Karl Marx


APÊNDICE III – Carta de Marx a Paul e Laura Lafargue

Disponível em: https://www.marxists.org/archive/marx/works/1870/letters/70_03_05a.htm.

Fonte: “Marx and Engels on Ireland”, Progress Publishers, 1971.

Transcrita por: Andy Blunden.

5 de março de 1870

Aqui, em casa, como vocês sabem, a influência feniana é predominante. Tussy é um de seus centros. Jenny escreve em seu nome no “Marseillaise” sob o pseudônimo de J. Williams. Eu não apenas tratei do mesmo tema na “Internationale” de Bruxelas e fiz com que certas resoluções do Conselho Central fossem aprovadas contra seus carcereiros. Em uma circular, enviada pelo Conselho aos nossos comitês correspondentes, expliquei os méritos da questão irlandesa.

Vocês entendem que não estou agindo por conta de sentimentos humanitários. Há algo além disso. Para acelerar o desenvolvimento social na Europa, é necessário impulsionar a catástrofe da Inglaterra oficial. Para tal, é necessário atacá-la na Irlanda. Ela é seu ponto fraco. Perdendo a Irlanda, o império inglês se vai e a guerra de classe na Inglaterra, até agora apenas sonolentamente crônica, assumirá formas agudas. Mas a Inglaterra é a metrópole mundial do latifúndio e do capitalismo.


Notas

1 [N.T.] Os ataques aos quais o autor se refere não são os mais recentes (2023), mas aqueles que ocorreram no ano que o texto foi escrito (2021). Ainda assim, seus comentários se mantêm relevantes.

2 [N.T.] As traduções do discurso e da carta de Marx estão disponíveis como apêndices (I e II) abaixo deste texto.

3 [N.T.] Texto referenciado pelo autor (em inglês): https://www.marxists.org/archive/kanafani/1972/revolt.htm. Versão em português: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/7572873/mod_resource/content/1/Ghassan%20Kanafani%20-%20Capitulo%20A%20Revolta.pdf.

4 [N.T.] “O Instituto de Inteligência (Hebraico: המוסד למודיעין ולתפקידים מיוחדים ha-Mosád le-Modiʿín u-le-Tafkidím Meyuḥadím), popularmente conhecido como Mossad, é a agência de inteligência nacional de Israel. É uma das principais entidades da Comunidade de Inteligência de Israel, juntamente com AMAM (inteligência militar) e Shin Bet (segurança interna). O Mossad é responsável pela coleta de informações, operações secretas e contraterrorismo. O seu diretor responde diretamente e apenas ao Primeiro-ministro de Israel. Seu orçamento anual é estimado em cerca de 10 bilhões de shekels (US$ 2,73 bilhões) e estima-se que empregue diretamente cerca de 7.000 pessoas, tornando-se uma das maiores agências de espionagem do mundo. Ao contrário de outros órgãos de segurança (como as Forças de Defesa de Israel ou a Agência de Segurança de Israel), seu propósito, objetivo, função, missãopoder ou orçamento não foram definidos em nenhuma lei”. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Mossad.

5 [N.T.] “Em 8 de julho de 1972, Kanafani então com 36 anos, foi assassinado em Beirute ao ligar de seu Austin 1100, detonando uma granada e em seguida uma bomba de plástico de 3 quilos plantada na barra do para-choques de seu carro. Kanafani foi incinerado, juntamente com sua sobrinha de dezessete anos, Lamees Najim. O Mossad, serviço secreto israelense, reivindicou a responsabilidade pelo assassinato”. Kanafani foi um dos fundadores da Frente Popular para a Libertação da Palestina. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ghassan_Kanafani.

6 Ver: https://www.haaretz.com/middle-east-news/palestinians/2018-01-21/ty-article/.premium/expert-warns-97-of-gaza-drinking-water-contaminated-by-sewage-salt/0000017f-dbb0-db22-a17f-ffb15dad0000.

7 Ver: https://www.nytimes.com/2021/05/18/world/middleeast/gaza-israel.html.

8 Ver: https://unctad.org/system/files/official-document/a75d310_en_1.pdf.

9 Ver: https://www.un.org/unispal/document/gaza-internally-displaced-people-ocha-map/.

10 [N.T.] O Movimento dos Fenianos (1867) foi uma rebelião contra a dominação britânica na Irlanda, organizada pela Irmandade Republicana Irlandesa, que reivindicava “a independência nacional para o seu país, a instauração duma república democrática e a transformação dos camponeses arrendatários em proprietários da terra por eles lavrada”. Fonte: https://www.marxists.org/portugues/dicionario/verbetes/m/moviimento_feninanos.htm.

11 [N.T.] Esta carta também está disponível abaixo do texto, traduzida para o português (apêndice III).

12 [N.T.] Esta é uma tese apresentada no texto “Contradição e Sobredeterminação”, de Louis Althusser, que pode ser encontrado na obra “Por Marx” e acessada neste link: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/289290/mod_folder/content/0/ALTHUSSER%2C%20Louis.%20Contradi%C3%A7%C3%A3o%20e%20sobredetermina%C3%A7%C3%A3o.pdf?forcedownload=1.

13 [N.T.] Possuímos dois textos que abordam este assunto. Para aqueles que desejam compreender melhor o paralelo entre a colonização irlandesa e americana, bem como a divisão racial no seio da classe trabalhadora (formando um “estrato intermediário de controle social”), o texto “Classe média: isca imperial. O espírito do colonialismo e a ‘regra de ouro’ do controle social” pode ser útil. Esse texto está disponível em: https://lavrapalavra.com/2021/03/10/classe-media-o-espirito-do-colonialismo-e-a-regra-de-ouro-do-controle-social/. Já para aqueles que desejam compreender melhor a centralidade e importância dos “brancos pobres” na política americana (e na manutenção da dominação burguesa e da supremacia branca nos EUA) até os dias atuais, pode ser interessante o texto “A farsa de Hillary Clinton: os delírios identitários da comédia neoliberal”, disponível em: https://lavrapalavra.com/2021/12/01/a-farsa-de-hilary-clinton-os-delirios-identitarios-da-comedia-neoliberal/.

14 [N.T.] Texto completo em inglês: https://www.ohchr.org/en/statements/2018/05/special-session-human-rights-council-deteriorating-human-rights-situation?LangID=E&NewsID=23100. Reportagem em português sobre o assunto: https://g1.globo.com/mundo/noticia/israel-mantem-moradores-de-gaza-enjaulados-em-favela-toxica-diz-chefe-de-direitos-humanos-da-onu.ghtml.

15 Ver: https://www.palestine-studies.org/en/node/1651117#:~:text=Combining%20historical%20analysis%20with%20textual,mutuality%2C%20and%20self-realization.

16 A Reforma começou na Inglaterra sob o reinado de Henrique VIII (através do Ato de Supremacia, que declarava o rei como líder da igreja no lugar do Papa, bem como de outros atos) e foi completada sob Elizabeth I (a adoção, em 1571, dos “39 artigos” da Igreja Anglicana – uma variante do protestantismo). A introdução da Reforma da Irlanda católica foi um meio de submetê-la ao monarca absolutista inglês e de expropriar sua população em benefício dos colonos ingleses sob o pretexto da luta contra o catolicismo.

17 Referência à Restauração da Dinastia Stuart na Inglaterra em 1660. Os Stuarts (Charles II e Jaime II) continuaram seu reinado até a Revolução Gloriosa de 1688-89. A Restauração foi resultado de um acordo entre a elite burguesa, a “nova” nobreza (que havia enriquecido durante a revolução) e dos aristocratas que apoiavam os Stuarts. Os apoiadores dos Stuarts (grande parte deles havia perdido suas propriedades na Inglaterra) passaram a receber títulos de terras irlandesas confiscadas em compensação. Era muito raro que representantes do novo regime respondessem à reclamações e petições pelo retorno de propriedades aos seus donos irlandeses e depois do ato de 1665, tais demandas nem eram consideradas. Portanto, a vasta expropriação da população irlandesa implementada durante a revolução burguesa inglesa foi sancionada pela monarquia restaurada.

18 O Código Penal era formado por um conjunto de leis transmitidas da Inglaterra à Irlanda, no final do século XVII e na primeira metade do século XVIII sob o pretexto da luta contra conspirações católicas. As leis privavam os irlandeses, de maioria católica, de qualquer direito político ou civil. Algumas das leis foram revogadas no final do século XVIII por conta do crescimento da luta por libertação nacional irlandesa.

19 O Parlamento Anglo-Irlandês, convocado no final do século XIII, foi inicialmente composto de representantes da igreja e da aristocracia fundiária. Na década de 1780, com o impacto do crescimento da luta por libertação nacional irlandesa, o governo inglês ampliou os direitos do parlamento, mas em 1801 ele foi abolido com o Ato da União.

20 A União Anglo-Irlandesa foi imposta pelo governo britânico depois da supressão da Rebelião Irlandesa de 1788. A União, que ganhou força em 1801, revogava a autonomia do Parlamento Irlandês. Uma de suas consequências foi a abolição de tarifas que haviam sido estabelecidas pelo Parlamento Irlandês.

21 Referência aos relatórios do Congresso da Basiléia da Primeira Internacional, publicado pelo Conselho Geral.

22 Marx escreveu: “1 de dezembro de 1869”, o que aparentemente foi um erro.

23 Karl Marx, “Le Conseil Général au Conseil Féderal de la Suisse Romande” (“O Conselho Geral ao Conselho Federal da Suíça Romanche”).

24 “Le gouvernement anglais et les prisionniers fénians” (“O governo inglês e os prisioneiros fenianos”), publicado em 27 de fevereiro de 1870.

25 Marx está se referindo ao Conselho Federal Belga.

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