A servidão voluntária

Por Nora Merlin em Contribuições Psicanalíticas a uma Política dos Afetos traduzido por Cian Barbosa. 

Segue o capítulo traduzido de Nora Merlin que integra a obra Contribuições Psicanalíticas a uma Política dos Afetos que será lançada neste sábado pela Editora LavraPalavra. A obra também conta com contribuições de Daniel Coelho, Daniel Omar Perez, David Pavón-Cuellar (em espanhol), Joel Birman, Miriam Debieux Rosa, Míriam Ximenes Pinho, Nora Merlin (em espanhol), Patrícia do Prado Ferreira, Rodrigo Gonsalves, Stelio de Carvalho Neto e Tatiane Andrade. A editora LavraPalavra disponibilizará os textos em espanhol do livro traduzidos por aqui, primeiro o de Nora Merlin e depois do lançamento o de David Pavón-Cuellar. Não deixem de conferir o evento de Lançamento neste sábado pelo canal do Facebook do LavraPalavra.


Na época do Antigo Regime, com a justificativa proveniente do direito divino de que a onda da autoridade dos reis emanava diretamente de Deus, o monarca concentrava o poder absoluto. Étienne de La Boétie, após estudar direito na Universidade de Orleans, em 1553 se converteu em Conselheiro do Parlamentar de Burdeos. Em 1548 escreveu o Discurso da Servidão Voluntária (de La Boétie, 2014), manuscrito que circulou de mão em mão e então oi publicado vinte anos depois. Nele, de La Boétie põe em questão a naturalidade(?) do direito do monarca. Se pergunta sobre a relação de sujeição e padecimento que existe entre o social e o poder: por que o conjunto social outorga o poder, trocando direitos e liberdade por servidão.

Como tantos homens, tantas cidades e tantas nações se sujeitam por vezes ao julgamento de um só tirano, que não tem mais poder que o que querem lhe dar; que só pode molestár-los enquanto quiserem o suportar; que só sabe prejudicá-los quando preferem sofrer que o contradizer (…). É esse povo quem se escraviza e suicida quando, podendo escolher entre a servidão e a liberdade, prefere abandonar os direitos que recebeu da natureza para carregar um julgo que causa seu dano e lhe embrutece. (de La Boétie, 2014, p. 45)

Na Europa do final do século XVIII, para contrariar o absolutismo do “poder real” (o do rei) e atribuí-lo à cidadania, surgiu o movimento revolucionário das democracias modernas, baseado nos princípios da liberdade e igualdade, que constitui uma alternativa frente ao absolutismo. Dali em diante, as decisões coletivas deviam ser adotadas mediante mecanismos e participação (direta e indireta) através de representantes legítimos. Uma incipiente democracia surgia como forma e convivência social, na qual seus membros deveriam ser livres e iguais, e as relações sociais se estabeleceriam conforme mecanismos contratuais. 

Constatamos que as democracias neoliberais ja não cumprem a função de limitar e regular o poder real, senão o contrário implica um retorno do absolutismo desse poder, hoje encarnado pelas corporações. A fase atual do capitalismo, o neoliberalismo, caracterizada pela concentração de poder financeiro e as corporações, supõe uma vontade ilimitada que busca extender globalmente seus valores e significações. Se apropria dos governos, das democracias, da vida em geral e está realizando o que podemos definir como seu maior triunfo: a colonização da subjetividade, a produção de um homem novo. Se trata de um individuo que habita uma sociedade de massas uniformizada e adormecida em uma hipnose coletiva, que cumpre ordens, consome compulsivamente, crendo-se livre e cidadão, sendo na verdade um escravo pós-moderno que não se reconhece como tal, diferente do escravo antigo.

O que acontece com a democracia quando a liberdade de mercado conduz à concentração de poder economico, político e simbólico? O que acontece quando os atos das maiorias, ainda que realizados conforme a normatividade formal democrática, são manipulados? Estas questões nos conduzem a pensar em uma crescente imcompatibilidade entre neoliberalismo e democracia, determinada pela tensão existente. Vemos aparecer o vetor social da servidão voluntária sob um novo cunho.

Atualmente não se trata de um poder exterior evidente encarnado no monarca, o amo antigo, o senhor feudal. Realizando um salto histórico e geopolítico ,tão pouco se trata do Plano Condor dos anos 70, consistentemente violentos e explícitos golpes de Estado na América Latina levados a cabo pelas forças armadas e o poder economico. Hoje a imposição é invisível, se trata de uma manipulação biopolítica que se fundamenta em um dispositivo corporativo do poder real: grupos econômicos, meios de comunicação concentrados, parte do sistema judicial político. As estratégias consistem na configuração de sentido comum de desde um totalitarismo comunicacional e semiótico que digita a opinião pública construindo cultura de massas através dos meios de comunicação monopolizados. Formando parte deste dispositivo, no campo da educação e da saúde mental se pretende instaurar um paradigma biológico que rechaça o inconsciente e o sujeito efeito do discurso, a memória, os legados simbólicos, históricos, políticos e sociais. Este paradigma pretende reduzir o corpo erógeno, pulsional, ao organismo e a um funcionamento sustentado em uma lógica organicista, produzindo uma subjetividade com etiquetas, transtornos e angústias, que busca-se reduzir por medicalização, adaptando-a a um totalitarismo de uma suposta normalidade imposta pelo poder.

Transcorreram muitos anos desde que de La Boétie escreveu seu discurso. Todavia, em pleno século XXI nos enfrentamos com o mesmo problema teórico e político que, em meados do século XVI o escritor francês denominou servidão voluntária: a relação que estabelece o laço com o poder real, antes às monarquia absolutistas, hoje as corporações.

Analizar este fenômeno nos permitiria compreender porque as pessoas atualmente aderem e votam políticas neoliberais que vão contra seus interesses e das democracias: dívida externa, desindustrialização, bicicleta financeira, perda de empregos, detenções arbitrárias, repressão e perseguição a opositores, desmantelamento do Estado, aumento dos índices de pobreza e desigualdade social, para mencionar algumas das suas características sobressalentes. Não acentuamos aqui os mecanismos de colonização que o poder utiliza, trabalho que realizamos em um texto anterior (Merlin, 2017).

De La Boétie sustentou que sem a obediência consentida pelos oprimidos não haveria poder real. Seu discurso segue ressoando atualmente na reflexão política, o que faz necessário voltar a ela a partir dos desenvolvimentos freudianos, sobre tudo fazendo eixo com o fenômeno da fenomenologia das massas descrito por Freud (1984) em 1921, época de ascensão do nazismo. A massa, paradigma social do neoliberalismo e modo atual de servidão voluntária, apresenta a obediência como rasgo específico que nos propomos a interrogar. O descobrimento freudiano do inconsciente permite substituir e reformular o “voluntário” da servidão pela obediência inconsciente. Não se trata somente da passividade frente a dominação nem de uma aceitação resignada ou um consentimento tácito, senão de um caráter compulsivo, ativo e decidido de submissão inconsciente. Através da constituição e aprofundamento das massas, a democracia deixou de ser o cenário privilegiado do debate comum para transformar-se no melhor modo para a obediência social e !voluntaria!, que a partir do descobrimento freudiano sabemos que a obediência consiste em uma repetição inconsciente.

A servidão é uma tese política sobre uma forma colonizada da subjetividade a partir da instalação, por parte dos meios de comunicação, de uma cultura de massas hipnotizadas que cumprem ordens. Não constitui só uma resposta moral individual nem refere-se a eleições singulares, senão que decreve um fenomeno coletivo de relação com o poder, um sistema de identificações, de crenças que funcionam como certezas e modos de satisfação.

A existência do monarca é efeito da rede de relações sociais entre um “rei” e seus “súditos”. Estes se identificam com essa posição, creem firmemente em ua condição de súditos e que devem obediência ao rei como se tratando de uma ordem natural e não da produção de um sistema de relações. Nos interessa interrogar essa trama de relações sociais, ajudicações, identificações e crenças que fazem existir o rei e os súditos, assim como a obediência repetitiva como modo de satisfação pulsional subjacente que adquiriu fixação compulsiva. 

A servidão voluntária é uma relação social com o poder, através de uma modalidade fascinada, acrítica e sugestionada. Uma lógica política de instituição do social fundamentada na obediência e em submeter-se a um poder concentrado real, simbólico e imaginário, que determina uma sujeição cuja particularidade é que causa a escravidão e já não é somente exterior, mas também interior. Ficam excluídas desta consideração, tal como afirma de La Boétie, as situações de servidão à força, como por exemplo pelas armas.

A Massa, paradigma social neoliberal

Freud Afirma (1984) que a hipnose, a massa e a paixão possuem um mecanismo de formação idêntico: o hipnotizador, o líder da massa e o objeto de amor ocupam o lugar do Ideal de Eu, nas três há obediência ao ideal e falta de crítica. A operação de idealização junto com o mecanismo de identificação dos que ocupam o mesmo lugar, desencadearão uma cultura de massas. 

A massa, essa paixão por ser Um, foi o modo social paradigmático do nazismo e é o do neoliberalismo. Por levar à uniformidade, à sugestão e à obediência pela via da idealização ao líder e a identificação entre os membros, constitui um dispositivo privilegiado para obter a servidão voluntária. A idealização consiste em um investimento libidinal que engrandece o objeto, acompanhado de um empobrecimento do Eu, que fica debilitado, fascinado, em posição de servidão apaixonada e sacrificada. Na paixão também se produz uma servidão voluntária com o objeto amado, mas que se compensa com a recuperação libidinal que implica ser amado. Na hipnose e com a massa (hipnose coletiva) a servidão voluntária emergente carece da compensação mencionada e da reciprocidade amorosa, porque o líder não ama os membros da massa. 

Em Populismo e psicanálise (Merlin, 2014) diferenciamos a construção da massa e do povo em Colonização da subjetividade (merlin, 2017) mostramos o modo pelo qual os meios de comunicação concentrados criam uma cultura de massas que forma o sentido comum e transforma o cidadão em um consumidor que obedece inconscientemente. Os meios massivos ao ocupar o lugar do ideal funcionam como líderes da massa, impondo um discurso único, que busca configurar a opinião através de um totalitarismo comunicacional e semiótico que se apropria do significado das palavras: como se houvesse uma relação natural entre significante e significado. Com uma retórica moralista, concebem a república como um sistema de instituições, leis e costumes que suprimem o “excesso”, o “caos” da política. Promovem o ideal de uma “democracia boa” que controle e discipline ao povo considerado como uma multidão violenta, enquanto o populismo é identificado como um totalitarismo corrupto, oposto à democracia e à república. Estabelecem, por exemplo que a política é sinônimo da violência, que a boa e civilizada democracia é sem povo, que a oposição desestabiliza. Os meios de comunicação concentram e dominam a res pública, o espaço da opinião pública, que se apresenta como uma ecolalia uniforme e desprovida de pensamento crítico.

O neoliberalismo produz uma subjetividade calculada pelo marketing, um sentido comum digitado, uma massa de autômatos com uma retórica repetitiva de frases vazias, frívolas e banais. O poder dos meios de comunicação opera promovendo identificações e imperativos, instalando afetos como o ódio, a angústia e a paixão pela ignorância. Encontra seu fundamento em um totalitarismo comunicacional e semiótico pela concentração, a censura e a sugestão, propagando crenças e preconceitos como significações absolutas que condicionam as percepções: fazer crer para ver. 

Identificações

A imagem é constitutiva do eu, produz estabilidade e funciona como um GPS que orienta a cena do mundo e dos ideais a alcançar. Os membros da massa buscam identificar-se entre si, “estar na foto”, pertencer, índice da prevalência que toma o registro imaginário.

A partir do desenvolvimento tecnológico e da revolução nas comunicações, a vida transcorre na Internet, Facebook, Instagram, etc.; entre selfies e redes sociais. O imaginário foi elevado exponencialmente, capturando o eu em um mundo de identificações, produzindo uma subjetividade alienada na virtualidade, a pós-verdade e o simulacro: o mundo se fez imagem virtual. 

Uma subjetividade manipulada por imagens comunicacionais desenhadas que resultam impostas pela força da repetição, terminam funcionando como ordens organizadoras da identidade e reforçam a posição de obediência dos membros da massa. A imagem televisiva virtual convertida em estratégia biopolítica principal constitui um modelo para que o cidadão seja guiado e adestrado, operando como uma bússola que dirige, ordena e opera sobre os corpos. 

Os meios de comunicação de massas, em particular a televisão, são formadores dos ideias sociais e da moral, postulando-se como garantidores “Da Verdade”. Desde esse lugar os meios concentrados organizam identificações universais e um mundo virtual que funciona como se fosse a única realidade. Se produz uma fascinação com as imagens, uma sugestão adormecedora na qual o sujeito se transforma em um objeto cativo hipnotizado pela televisão, se submete inconscientemente às imagens. Esta perspectiva derruba por terra a ideia da suposta liberdade que outorgam a informação e as mensagens comunicacionais, se bem aparentam ampliar a liberdade individual, em sentido estrito se impõem a partir de identificações, condicionando eleições, valores e cosmovisões. Desta forma, operam sobre a subjetividade chegando a disciplina-la, adoece-la e manipulá-la. O predomínio da realidade virtual conduziu a civilização a um funcionamento organizado fundamentalmente por identificações e por uma lógica social individualista, reduzindo o sujeito a ser um objeto confundido entre o que é e eu e o outro, que vai funcionar alienadamente em uma organização social que é a massa. 

As imagens funcionam como modelos normativos de adaptação ou metas a serem alcançadas. O poder neoliberal despolitiza o social e impõe uma estética e uma moral que determina as fronteiras do que entre na imagem e o que fica fora, o que é e o que não é vida humana. O mundo tornou-se imagem virtual o que implicou, entre suas consequências mais sérias, certo achatamento mental, um pensamento linear e superficial, oposto à profundidade e multiplicidade de perspectivas. Nessa época, caracterizada pelo império do imaginário, se debilitou a função da palavra, da qual depende a relação com a verdade, assim como o valor da racionalidade. Com a depreciação da palavra, o desenvolvimento das novas tecnologias e a cibernética, se elevou ao zênite o imaginário como o registro privilegiado onde se buscam referências e saberes para se orientar. As mensagens comunicacionais se baseiam hoje fundamentalmente na imagem, cujo poder de fascinação determina a manipulação biopolítica que os meios de comunicação realizam. 

Essa captura possibilita os fenômenos globais atuais de servidão voluntária e apego a certas estruturas de poder, que operam como uma ordem que vai contra os interesses de populações inteiras. Frente a esse panorama surgem interrogações: como atravessar os “espelhos” identificatórios que produzem uma cultura de massas uniforme, submetida ao poder das imagens? É possível uma construção cultural menos alienada à imagem?

A luta política deve considerar ir além do confinamento em cavernas virtuais e transcender as imagens normativas que pretendem reduzir desejos, aspirações, esperanças. 

IMPERATIVOS

O capitalismo constitui um modo social que nega a impossibilidade, sutura a falta estrutural do sujeito efeito da linguagem e tampona os furos do corpo com objetos de consumo. As técnicas de marketing desenham uma cultura organizada como um negócio no qual se naturaliza e se fala de capital humano, se medem rendimentos, se estabelecem objetivos que nunca se alcançam porque nada alcança a demanda esperada, provocando que o sujeito inevitavelmente se constitua como um devedor. 

Na medida que se desenvolveram, os meios de comunicação foram tomando um lugar cultural privilegiado, o lugar do Ideal, que nos termos de Freud (1984) circunscreve do que ocupará o líder da massa, na época o único sujeito dessa construção, uma vez que seus membros estão na posição de objetos. Este sistema se sustenta em imperativos ao consumo que terminam introjetado e que vão operar com uma voz interior que explora o sujeito. Na versão neoliberal do capitalismo atual, estes mandamentos adquirem um caráter ilimitado e insaciável: toda tentativa de realização será sempre insuficiente em relação a essa exigências. Os meios de comunicação neoliberais são concentrados, constituem a voz do poder, geram um discurso monolítico que se impõe a uma subjetividade obediente que constitui um sistema fechado, a massa. Utilizando a figura de Kant (2000) em !Resposta à pergunta O que é a ilustração?” para expressar a posição da minoridade etária, a massa consiste em um rebanho de ovelhas tocadas por um pastor a quem nada falta, por consequência falta em discurso e demandas que expressam pedidos, pois para que surja uma demanda e amor e de saber é necessária uma falta, uma incompletude, uma inconsistência. Um sistema fechado como a massa traz entre suas consequências o rechaço do amor e do saber, assim como um reforço do ódio e da ignorância, duas paixões fundamentais que se manifestam no capitalismo.

O ódio, um afeto antipolítico

Alcançar o apoio da sociedade civil se mostra decisivo para uma força política que pretende se impor. Neste sentido, a propaganda constitui uma ferramenta fundamental para formatar a opinião pública e conseguir consensos O nazismo rapidamente o compreendeu e gerou uma estratégia comunicacional exitosa como nenhum movimento político havia conquistado, podendo se afirmar que “fez escola”. Seu livro de propaganda mais notável foi Mein Kampf, no qual Hitler desdobra suas crenças e seu amor ao povo alemão. Está fortemente influenciado pelo livro de Gustave Le Bon (2005), Psicologia das massas, no qual afirma que a propaganda é uma técnica adequada para controlar o comportamento irracional das multidões. Os indivíduos se “contagiam” com o comportamento dos demais e os repetem sem questionamentos. 

A propaganda nazi consistiu em fomentar ódio e fabricar uma comunidade assustada, mediante a técnica da criação dos judeus como o inimigo interno, o “bode expiatório”, obtendo duas vantagens: por um lado conseguir coesão social pelo caminho da hostilidade contra um elemento agregador, e por outro distrair a opinião pública de questões urgentes. Esse ódio radical alimentado cotidianamente pela propaganda se articulou com o ideal da “higiene racial”, a necessidade de criar “arianos verdadeiros” e tirar de circulação os “defeituosos”. Um argumento fascista expressado como ideal moralista: toda “imperfeição” constitui uma ameaça para a pureza do povo alemão, uma racionalização cuja função é encobrir o ódio racista. O ódio se concentrou contra o judeu, ao qual se denegria de maneira injuriosa: eram os débeis e corruptos, parlamentares cúmplices dos humilhantes tratados de paz, os proletários agitadores, os financistas avarentos e os grandes industriais que comprimiam o povo alemão; um inimigo perigoso consumido pelo dinheiro que contamina a nação com sua maldade, resultando na necessidade de erradica-los.Adolf Hitler e os nazistas foram responsabilizaram ao “judaísmo internacional” o desencadeamento da guerra, a derrota alemã e a crise econômica; paradoxalmente as vítimas da “solução final” eram criminosos contra a humanidade. 

Em toda a Alemanha se viam cartazes, filmes, animações e folhetos com caricaturas antissemitas e racistas: imagens que representavam os judeus com dentes torcidos, unhas de animais, saliva caindo dos lábios e olhares condicionados.

Hitler compreendeu muito cedo que uma estrutura de massas era mais eficaz para a condução e controle político, e que o amor ao líder junto com o ódio ao inimigo externo eram fatores de coesão. Como líder da construção de massas, com o Führer ocupando o lugar da causa, sua voz funcionou como um imperativo sobre a massa, rebanho obediente com sede de obedecer. 

Em “Psicologia das Massas e Análise do Eu”, referindo-se ao exército e à igreja, Freud (1984) afirma que estão organizados como uma massa. A cultura alemã sucumbiu ao que poderíamos definir como uma nova religião: o nazismo. Ninguém poderia imaginar até que ponto esse movimento penetraria nas relações sociais. 

Observamos que os governos neoliberais de todas as regiões utilizam a mesma estrutura de propaganda empregada pela Alemanha nazista (não estamos homologando projetos políticos respectivos). Focando na matriz comunicacional e propagandística, encontramos o desenvolvimento de uma mesma lógica: a instalação de um inimigo interno com um ódio radical contra ele, mascarado por um nacionalismo ou republicanismo supremos que constituem máis uma moral que uma política. A psicanálise define como “formaão reativa” o mecanismo que transforma ódio em traço de caráter sustentado em um oposto, que é enfatizado e aceito pelo eu e pela sociedade. A instalação do ódio sobre o inimigo interno se cumpre sobre ideias, dirigentes políticos e sociais demonizados que tomam o papel de “bodes expiatórios”, articulando-se a uma retórica moralista exarcebada, republicana e nacionalista, que lutará contra “o mal” que ameaça o social. A consolidação do ódio conduz ao medo social, à ruptura dos vínculos, desembocando no racimo e na xenofobia: a perseguição, repressão, desaparecimento ou morte dos “inimigos da Pátria” estarão justificadas. 

Na Argentina, através da propaganda e da manipulação do sentido comum, o poder direcionou a instalação do ódio contra o peronismo, movimento político que encarnava o popular.

Em 16 de setembro de 1955 se produziu na Argentina a autodenominada Revolução Libertadora, uma ditadura militar que governou após ter derrotado o presidente constitucional Juan Domingo Perón. Em nome dos ideais republicanos de trazer tranquilidade, ordem e liberdade à Nação, decretaram a dissolução do partido peronista, de sua ideologia e simbologia. O grupo golpista encampou um ódio irracional a Perón, Evita e ao peronismo, e decretou proibido pronunciar esses nomes e todo rastro ou pegada peronista porque as considerava “más palavras”. Diziam sobre Perón: “ditador, que se empenhou, tirano demagogo, milico facho, admirador de Mussolini, abusador sexual das jovens de UES”, etc. De Eva expressavam: “Viva o câncer, puta” e do peronismo, “nazistas, fascistas, falangistas, zoológico aluvião, bárbaros”, etc. 

Com uma matriz semelhante, os militares do golpe e Estado de 1976, em cumplicidade com setores da sociedade civil, desempregaram uma estratégia propagandística que permitiu impor o terror com o argumento moralista de restaurar a ordem perdida, a paz, os princípios éticos, a família e o ser nacional. Para conseguir a aceitação social da repressão, a Junta Militar manipulou a opinião pública através da propaganda alimentando o ódio contra os inimigos internos que precisavam fazer desaparecer: “subversivos, marxistas, violentos, a militância, os terroristas”, etc. Empunhando o ideal de servir à pátria, cumprir com o dever de reorganizar a sociedade de maneira direita e humana, reinstalar valores ocidentais e cristãos, assumiu uma função “normalizadora”. Uma retórica moralista que nada tinha de republicana e era escusa para legitimar socialmente a repressão, o autoritarismo e implantar o ódio social contra o “inimigo” interno. 

Em 2015, o governo de Cambiemos conseguiu ser eleito democraticamente, fundamentalmente graças a sua excelente estratégia propagandística, que seguiu os princípios da escola alemã: criação do inimigo interno e ódio articulado a um princípio moral “repubicano”. Os significantes “corrupção” e “herança pesada”, a instalação de um desejo de mudança a favor da República e a honestidade, a coesão de seus aderentes através da instalação do ódio frente ao novo inimigo interno: o kirchnerismo e seus derivados, os militantes, Milagro Sala, os ñoquis, os preguiçosos, os “choriplaneros”, os mapuches, etc. 

Os meios de comunicação concentrados, agitadores do ódio, acusam como se fossem juízes aos “culpados” e alimentam com suas lesões o consenso “republicano” contra os que “roubaram tudo”. Manipulam o sentido comum. Quem pode estar a favor dos ladrões?

Configuram uma massa colonizada e coesa pelo ódio, estimulam um sadismo extremo que justifica a repressão, a vingança, a violência e seu uas diferentes manifestações: há quem aplauda as demissões de trabalhadores, a perseguição de militantes e pede mão forte. Se alimenta o racismo, a xenofobia, o machismo, a agressividade, a injúria, com racionalizações que tomam a forma de normas necessárias para a civilização. Estas expressões adquirem um estatuto antipolítico, já que ao estarem fundadas no ódio atentam contra o tecido social e a formação de comunidade.

O neoliberalismo só pode alcançar a aceitação social colonizando a subjetividade através da propaganda. O poder ataca com sua artilharia econômico-midiática-judicial e está ganhando a batalha cultural ao tomar a imposição de significados. O ódio encoberto por um republicanismo hipócrita que de maneira invisível rechaça a política, promove a violência e deprecia o povo. Essa atitude transforma a democracia, que deve ser o governo do povo, em uma ceocracia moralista constituída pelas belas almas que vem para “fazer o bem”, atuando com um molde conhecido de submissão aos poderes corporativos. 

A democracia implica em botar no jogo a palavra livre e plural em virtude da qual os homens fazem o mundo comum. A política não desvaloriza o dissenso, não converte o adversário em inimigo senão outorga dignidade ao adversário. Quando o conflito de interesses se transforma em um problema moral entre os grupos divididos entre bons e maus, corruptos e decentes, violentos e pacíficos, populistas e republicanos, a política desaparece e a democracia se degrada em uma versão moralista e autoritária, com o risco de desaparecer. A “solução” moral conforma uma sutura inadequada frente aos problemas que tomam a vida em comum, que em vez de pacificar as relações sociais incrementam a hostilidade.

Hanna Arendt (2003) com seu conceito de banalidade do mal possibilitou interpretar que Eichmann, responsável direto pela solução final na Polônia, se converteu em um genocida sem sentimento de culpa. Não era um sádico, nem um perverso, nem sequer um anti-semita, senão uma pessoa “normal” que se limitou a cumprir ordens e expressou que faria novamente se necessário. Por que não registrava sua ação como um ato mau? Porque nessa época o crime era a norma. 

Se o ódio e a satisfação na vingança contra o adversário político é a regra naturalizada na cultura, se justifica-se o ódio e se o envolve com ideais morais, por que uma pessoa se questionará sobre sua ação, sua conduta, seu desprezo pela vida dos demais, que resulta em um desprezo pela própria? Por que abandonará sua miserável banalidade do mal?

Uma subjetividade colonizada pelos imperativos invisíveis do aparato midiático goza de uma paixão pela ignorância: não quer saber de nada, nem sequer é capaz de recohecer sua submissão. 

A paixão pela Ignorância

A servidão voluntária da massa toma como um de seus fundamentos a paixão pela ignorância. Isso implica não querer escutar, ver nem saber e vai de acordo com a promoção do narcisismo, de uma exacerbação da imagem cuja função é tapar a falta, promovendo um individualismo descarnado que tenta não ser afetado pelo laço social. Da mesma forma, nos encontramos cada vez mais frequentemente com indivíduos que preferem não saber e se satisfazerem com a ignorância, que configura uma paixão conservadora a respeito do estabelecido. Não nos referimos neste caso à educação formal, que por outra parte não garante a ausência dessa paixão, senão um desejo de não querer saber sustentado, por uma parte, em uma comodidade homeostática e inercial própria do instituído, e por outr, em uma covardia, um horror ao saber que comove a crença. Esta paixão pela ignorância resulta funcional ao capitalismo, constituindo um dos maiores obstáculos para transformar a posição do sujeito. 

para alimentar o desconhecimento, o neoliberalismo faz uso da repressão através do Estado polícia e das estratégias dos meios de comunicação concentrados como a negação, a pós-verdade e o desmentido, mediante a instalação de crenças e a manutenção dos preconceitos. 

A Pós-verdade: sugestão pós moderna

Freud, que em seus inícios começou trabalhando com o método da hipnose, descobriu que a presença e a palavra do hipnotizador exerciam uma influência profunda. O paciente se sugestionava, acreditava no poder do médico, se tornava obediente, submisso e obtinha uma cura na qual os sintomas desapareciam temporariamente, para logo então retornar. Foi uma das principais razões pela qual Freud abandonou definitivamente esse método, além de que ele mesmo sustentava que não era um bom hipólogo, mas também porque gozava de exercer esse poder, o que o tornava eticamente questionável. Constatou que nem todos os pacientes eram hipnotizáveis, que havia um humor pessoal, uma idiossincrasia singular que ia contra a universalização do método. Alguns que não eram hipnotizados mostraram um resto rebelde que resistia, um obstáculo que mostrou-se fecundo. Graças a essa dificuldade, Freud mostrou o mecanismo psíquico da resistência e desde então só restava um passo para o descobrimento que veio mudar o mundo: o inconsciente e a psicanálise. Se extrapolamos o campo social da experiência inicial da psicanálise com a hipnose, podemos afirmar que nem toda subjetividade está colonizada: há um resto rebelde que resiste a ser curado, adaptado, adormecido e “civilizado”. 

Anos mais tarde, com a teoria psicanalítica já avançada, Freud (1984) comprovou que existem instituições organizadas como massa e, adicionamos, culturas de massas, que se comportam ao modo da hipnose coletiva. “A massa obediente frente a autoridade quer ser dominada e submetida e temer aos seus amos (…). Frente à influência da sugestão, as massas são capazes também de grandes demonstrações de abnegação, desinteresse e consagração à um ideal” (Freud, 1984, p. 75).

Chegamos à conclusão de que a hipnose tem um funcionamento homólogo ao da massa, no que ambas possuem mecanismos idênticos de constituição: a crença na autoridade que conduz à submissão e à obediência. 

A crença

Para esclarecer a conformação da massa, Freud (1984) considerou o que denominou duas massas artificiais: a igreja e o exército. Afirmou que na massa os laços libidinais operam em dois sentidos: por um lado vinculado aos membros entre si e, por outro, de todos esses com seus líderes. Os membros da massa tem a ilusão de que o líder os ama por igual a todos, esta seria uma das crenças da qual dependeria a coesão da massa. “As massas nunca conheceram a sede da verdade. Pedem ilusões da quais não podem renunciar. Assim, a massa se move pela predominância da fantasia e da ilusão sustentada pelo desejo não realizado” (freud, 1984, p. 76).

Freud elaborou esse fenômeno da crença em vários artigos. Em “Moisés e o monoteísmo” (1986c) analisou a fé nas religiões, dando conta de que o crente deixa de lado a racionalidade, e inclusive pode admitir a irrealidade de sua crença, apesar de aderir a ela e a conservar como uma verdade absoluta. Freud se refere à paráfrase de Tertuliano Credo quia absurdum (“Acredito porque é absurdo”) para justificar que, apesar dos dogmas religiosos serem indomáveis, possuem um valor de verdade que não se fundamentam no racional nem na compreensão, tornando-se irrefutáveis. O crente não necessita da lógica nem requer nenhuma demonstração, confia e cumpre com um ato de fé. Daqui se deduz que não é possível impugnar uma religião pela rigidez de seus dogmas, manejar a ausência da racionalidade ou o não demonstrável de suas afirmações.

Não conhecemos culturas sem deuses, sejam do paganismo ou o Deus das três grandes tradições monoteístas. O fenômeno religioso se origina em uma forte necessidade do homem pela proteção e autoridade. A tese que Freud (1986b) sustenta em “O futuro de uma ilusão” é que todas as religiões se baseiam na saudade de um pai, pela necessidade de tornar suportável o desamparo humano. As crenças não se fundamental em erros de compreensão ou aprendizado, senão num sistema de ilusões de um desejo que dá sentido, pacifica, torna suportável o desamparo pelo seu efeito estabilizador. 

Freud (1986c) afirmou que as crenças respondem a uma necessidade estrutural que excede a religião: o sujeito se apega a elas com um conhecimento inigualável porque o organiza e o sustenta, constituindo um método de busca da felicidade e um modo de evitar o sofrimento.

As crenças conformam, definem a realidade constituindo uma matriz para interpretar a vida. Determinam e condicionam as percepções, operando como preconceitos inquebráveis, desviando das evidências que a oponham: se crê, logo e vê. O sujeito não está disposto a renunciar de suas crenças na medida em que se trata de ilusões que o defendem do desamparo. Salva sua crença, a conserva e é capaz de resignar a um argumento racional que reconhece como desmentindo uma parte da realidade exterior em função de se agarrar à fontes de prazer. Renega como na expressão “eu sei, mas ainda assim…”, com a conseguinte alteração psíquica: uma atividade do pensar ficará separada do exame da realidade e submetida ao princípio do prazer, respondendo à lógica do inconsciente. 

As crenças se mantém sem se importar com a lógica racional, porque constituem significações fixas e muitas delas funcionam como respostas de consolação à angústia. Lacan (2006) em “O triunfo da religião”, conferência pronunciada em Roma, 1974, sustentou que a religião triunfará sobre a ciência, porque é provedora de sentido e terá muito motivos a mais para perdurar e acalmar as almas frente às perturbações que a ciência introduzirá, sustentada pelo discurso capitalista.

As crenças não constituem algo exclusivamente mental ou íntimo, senão põem e jogo a realidade social efetiva, condicionando as percepções, a atuação, as eleições, etc. As crenças se “apodera” da subjetividade e terminam sendo o envolvimento formal de repetições rituais e modos de satisfação que adquirem fixação. 

A massa, o reino da obediência, por se tratar de um laço libidinal no discurso, constitui o modo social privilegiado para o desenvolvimento da crença indiscutida e fascinada no poder do líder: a onipotência que se atribui a ele, protege a emergência da angústia. “Quando uma massa se decompõe, se gera pânico, os laços recíprocos são terminados, e se libera uma angústia enorme.” (Freud, 1984, p. 91) 

Angústia

O ser humano nasce indefeso, em estado de vulnerabilidade, o que obriga-o a um vínculo de dependência com um Outro que o fará de suporte e o introduzirá  no mundo simbólico. Vulnerabilidade e desamparo são termos que definem o estado de maior angústia tanto em Freud (1986a) como em Lacan (1988). Para Freud, a Hilflosigkeit, o desamparo, constitui o estado no qual o homem, nessa relação consigo mesmo, não pode esperar ajuda de ninguém, o desassossego absoluto, matriz das situações posteriores de angústia que o eu irá enfrentar: “mas essa angústia está encoberta; o eu se subtrai dela executando, obediente, os mandamentos, preceitos e ações expiatórias que o são impostas” (Freud, 1986a, p. 122).

A obediência constitui uma elaboração sintomática da angústia, uma medida de suposta proteção frente a ela: a submissão aos mandamentos vem em um modo de satisfação pulsional que cobra rigidez. “Constitui um triunfo da formação de sintoma que consiga enlaçar a proibição com a satisfação, de modo que o mando da proibição originariamente rejeitantes cobrem, também, o significado de uma satisfação.” (Freud, 1986a, p. 107).

O neoliberalismo caracterizado pela degradação dos mecanismos simbólicos da regulação e proteção da subjetividade, o enfraquecimento dos Estados e a erosão dos laços sociais, arrasa com os legados, a memória, os discursos, a história e a política. Um sujeito submetido ao atual dispositivo do mercado, cruel e insaciável, fica de fora, desprovido de mecanismos de proteção, em uma situação de angústia, em permanente ameaça pela perda de direitos e das condições de existência. Do mesmo modo que o eu se subtrai da angústia executando obediente os mandamento, preceitos e ações que o são impostos, um corpo social não escutado, registrado e desamparado, constitui caldo de cultivo para uma irrupção de angústia que conduz à obediência e à submissão. Em conclusão, a obediência característica da servidão voluntária constitui um sintoma social que tenta evitar a angústia, afeto privilegiado do neoliberalismo. 

O poder impõe preconceitos, crenças, promove uma resignação sacrificial e angustiante, temerosa e covarde. Primeiro instala o medo, mas também o terror, e logo promete segurança; a massa ingenuamente crê que se obedecer estará a salvo pela ilusão da “segurança protetora”. O preço a pagar é trocar liberdade por submissão. A humanidade desconhece que fez um trato com o poder real global: oferece sua submissão em troca de segurança. 

Em contraposição, afirmamos que uma cultura democrática com mecanismos de regulação que apontem à desconcentração do poder constitui o melhor antídoto contra essa servidão da subjetividade. 

Referências bibliográficas

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