Por Michael Parenti. Traduzido por Eros Viana, via New Political Science.
Quem nunca se deparou, ao pesquisar sobre Lênin, Stálin, Trotsky, Fidel, ou Mao, seja no Google Acadêmico ou seja na barra de pesquisa da Amazon, com livros, artigos e textos que prometiam desvelar essas e outras figuras revolucionárias a partir de sua psique? Que prometiam entrar profundamente nas maquinações de uma mente perturbada e maquiavélica e revelar suas mais profundas origens, como as “origens da mente totalitária”? Ou quem nunca ouviu falar que comunistas (Especialmente os jovens comunistas), os anarquistas e demais pensadores revolucionários são “jovens rebeldes sem causa”? Que estavam exprimindo um “idealismo característico da juventude e da infância”? Esta pretensa forma de “análise” – supostamente “histórica” – tem nome: psicopolítica.
Este escrito é uma forma de manifesto contra a produção de um consenso despolitizante que os ideólogos da ideologia dominante produzem ao se referirem ao debate de figuras políticas, especialmente sobre revolucionários e figuras políticas de esquerda. Com a utilização de um método dúbio e muito falível, sem qualquer capacidade de previsão, ou qualquer poder de explicação da realidade material, os ideólogos burgueses tentam trazer os debates para as condições de que tipo de “mente” teriam os revolucionários, ora patologizando o discurso revolucionário em si como uma doença, ora afirmando que a produção de seu discurso provém de questões não resolvidas em suas infâncias, tentando forçar uma “real razão” para as revoluções. Aparentemente, segundo estes ideólogos, as motivações revolucionárias jamais são por motivos como fome e miséria em que se encontra a população trabalhadora e jamais, sob qualquer aspecto, se analisa a materialidade da classe trabalhadora como ponto de partida das revoluções. A motivação seria, segundo eles, estritamente psicológica.
Isto não é afirmar que o debate que Michael Parenti faz nestas páginas é um debate contra a psicologia ou contra a utilização de elementos das ciências e teorias que tomam conta desta área para a análise do debate público e político, muito pelo contrário. Como ele demonstra na última sessão deste artigo, existe sim um espaço importante para o debate sobre a psicologia para entender o pensamento das massas e sobre a psicologia social. Há a necessidade de compreender os impactos que as duras condições do capitalismo impõem. Afinal, a exposição prolongada à uma situação de fome ou de insegurança alimentar pode deixar marcas profundas como ansiedade, traumas e transtornos generalizados.
Neste breve artigo, Parenti faz aquilo que é necessário para desvelar a ideologia burguesa que procura “entender” Lênin, Stálin, Trotsky, Mao ou Fidel a partir de uma análise de sua infância e de sua psique. Para isso, o hábil autor estadunidense analisa o conteúdo de classe escondido nestas análises em si, revelando o seu caráter profundamente reacionário e conservador em defesa do status quo capitalista.
N.T.: Será usado para notas de tradução.
N.A.: Será usado para notas do autor.
CONTRA A PSICOPOLÍTICA
Nas últimas décadas, numerosos historiadores, cientistas sociais, psicólogos e analistas políticos têm cada vez mais aumentado a sua dependência da psicologia para explicar o fenômeno político. Ao fazê-lo, eles tendem a tratar a realidade política como acontecimentos superficiais de baixo da qual se espreitam dinâmicas mais profundas e mais convincentes. Supostamente líderes e massas são dirigidos por forças emotivas mais profundas que pouco têm a ver com o conteúdo manifestado de assuntos públicos. Eu acredito que esta dependência da psicologia psicanalítica ou “profunda” produz pouco material que seja de confiança, reduz a significância da vida política, e retarda o entendimento de tal.
Entre os principais pioneiros mais avançados na psicologia política estava Harold Lasswell, um cientista político por profissão, mas altamente influenciado pelo Freudismo, e ele próprio um analista leigo. Há mais de 60 anos atrás Lasswell postulou a seguinte fórmula para explicar o “homem político”: p} d] r =P. Os motivos privados do indivíduo, p, “nutrido e organizado em relação à constelação familiar e do primeiro self”[1] são deslocados, d, em objetos públicos. O deslocamento é então racionalizado, r, em termos de interesses públicos para produzir o homem político, P (Lasswell 1930, p. 74).
Como um exemplo de deslocamento político, Lasswell nota: “A proeminência do ódio na política sugere que nós talvez descubramos que o motivo privado mais importante é um ódio poderoso e reprimido contra a autoridade, um ódio que veio à expressão parcial e repressão [recalque] em relação ao pai.” E “o ódio reprimido ao pai talvez se volte contra reis ou capitalistas”. Indivíduos que condenam “a impiedosa exploração do proletariado desprovidos de ferramentas, [feita] pelos capitalistas” talvez estejam só dando “a justificativa racional” de animosidades familiares previamente não resolvidas (pp. 75-76). Não apenas indivíduos, mas inteiros “movimentos políticos obtêm sua vitalidade [através] do deslocamento de afetos privados em objetos públicos” (p. 173).
Considere alguns exemplos de como esse modelo de deslocamento-racionalização tem sido aplicado: em 1969, o notável psicólogo Bruno Bettelheim atribuiu aos protestos antiguerra[2] que estavam varrendo os campi da nação a influência de uma sociedade permissiva e a “culpa” que os estudantes sofriam por terem evitado o serviço militar. Como Bettelheim explicou para um Subcomitê da Casa de Educação [House Education Subcommittee]: os estudantes, cheios de culpa, tendo evadido o serviço militar, “se sentiam como parasitas da sociedade e assim vieram a odiar a sociedade, a qual eles pensam que os fizeram se sentirem desta forma” (Bettelheim, 1969).
Indo além de Bettelheim, Lewis Feuer diagnosticou praticamente toda rebelião estudantil no século XX como se sofressem de uma hostilidade irracional para com figuras substitutas de seus pais. Ele observa que Fidel Castro, que desenvolveu seus trejeitos rebeldes durante seus dias como estudante, “repetidamente culpava a outros, isto é, seu pai, pela sua entrada no estudo do direito” um campo que ele não realmente desejava seguir. Isto “sugere algumas das raízes do próprio conflito geracional de Castro e indiretamente seu anti-americanismo. Em sua culpabilização dos outros por terem enganado ele, os Estados Unidos se tornaram o pai substituto a ser culpado” (Feuer, 1969, p. 250). Porém, nem todas as rebeliões estudantis tinham como fim esses “pseudo-objetivos”. Segundo Feuer, as rebeliões estudantis em países comunistas eram a exceção; elas representavam uma “busca por liberdade real” (p. 311).
Despolitizando o Político
Como as ilustrações anteriores podem sugerir, explicações psicopatológicas tendem a ignorar todo conteúdo político do fenômeno em questão e conjurar uma necessidade apolítica, que se presume possuir um controle predeterminado sobre participantes políticos. Então Lasswell não lida com a possibilidade aparentemente mais evidente de que pessoas odeiam reis ou capitalistas não por causa de conflitos filiais, mas sim porque elas acreditam que as condições sociais impostas pela autocracia e pela plutocracia são odiosas. A mesma coisa com Feuer. Em uma Cuba controlada por um tirano muito odiado apoiado pelos EUA como Fulgencio Batista, onde grandes indústrias, mercados, terras, trabalho e capital eram dominados pelas corporações dos EUA e um grande segmento da população vivia em pobreza, devemos acreditar que os agravos de um cubano direcionados aos detestados “Yanquis” eram primariamente um deslocamento de uma hostilidade filial ancorada em um ressentimento por ser obrigado a ir para a faculdade de direito? E os outros vários milhares de pessoas que se juntaram às fileiras revolucionárias? São todas elas afetadas principalmente por antagonismos familiares não resolvidos – como afirma Feuer? Se sim, a história está em notável débito para com as deficiências que talvez existam em relacionamentos pai-filho.
Investigadores psicologicistas presumem que a relação filial não apenas precede como também suplanta as experiências posteriores da vida e as influências da esfera social mais ampla. Mas esta premissa permanece não-examinada: é um psicologismo autodeterminante. Não apenas alimenta ignorância política ao oferecer uma explicação reducionista apolítica da história política, ela também depende da ignorância política para sua credibilidade. Apenas ao ignorar dados políticos importantes que tal especulação psicológica ganha um momento de plausibilidade. Para ilustrar: qualquer um que ouviu ao ultraje que estudantes expressaram contra a Guerra do Vietnã, que foram testemunhas daquilo que eles estavam realmente falando, escrevendo e fazendo, podem ter licença para rejeitar a disputa de Bettelheim de que eles eram motivados por sentimentos de culpa por não serem alistados para lutarem na própria guerra que eles detestavam. A evidência observável de suas palavras e feitos sugere que eles se opunham à guerra pois acreditavam ser injusta e destruidora de vidas inocentes. O que falta na visão de Bettelheim é tal evidência observável. Tudo que temos são imputações que negam o conteúdo da luta política e que atribuem um motivo psíquico bem conhecido apenas por Bettelheim através de um processo de descoberta o qual ele não revela.
Presunções políticas escondidas
Enquanto estes tipos de explicações psicológicas tendem a despolitizar a realidade política, eles o fazem de uma maneira politicamente seletiva. Por exemplo, Bettelheim nunca pensou ser necessário passar um pente fino nas psiques daqueles que ordenaram e conduziram os bombardeios de saturação[3] com os aviões B-52 na Indochina. Assim como o anticomunista Feuer jamais considerou procurar por motivos escondidos entre estudantes dissidentes em países comunistas — cujas rebeliões ele apoiava e considerava livres de psicopatologia. Similarmente, Arnold Rogow parece equalizar o desvio político com anormalidade psicológica quando ele escreve: “Enquanto a maior parte dos líderes políticos nem exigem nem merecem uma psicobiografia, a forma é particularmente apropriada quando lidamos com carreiras políticas estranhas e desviantes … de extremistas de direita e de esquerda” (Rogow, 1968, p. 605). Um julgamento político está sendo feito aqui. Os líderes referidos por Rogow são “estranhos e desviantes” politicamente falando, não psicologicamente falando. O fato de que este desvio político necessita em especial de investigação psicológica é aquilo que deve ser demonstrado ao invés de presumido. O que muda entre um líder estar agindo com admirável “firmeza” ou “rigidez agressiva” em uma situação muito comumente dependerá dos valores políticos e da visão do observador (George 1974, p. 235-36). Em uma só palavra, o que é e o que não é “deslocamento psicológico” pode ser comumente determinado menos pela psicologia do ator político do que pela política do psicólogo.
Culpa Prima Facie
A visão da sociedade de quem é perturbado psicologicamente repousa largamente nos padrões da normalidade. Não surpreendentemente, rebeldes que desafiam crenças convencionais são mais prováveis de serem diagnosticados como se fossem dirigidos por motivos privados aberrantes do que aqueles que não o fazem. Rycroft observa que muitos daqueles que “balançam o mundo” e outras pessoas excepcionais foram “maltratadas por psiquiatras e por [psico]analistas… Jesus Cristo já foi diagnosticado como esquizofrênico, Beethoven paranoico, os Profetas do Antigo Testamento (Coletivamente) esquizofrênicos, Leonardo da Vinci esquizoide-obcecado, etc, etc.” (Rycroft 1971, p. 8)
Alguns de nós acreditamos que pessoas normalmente se rebelam porque não está tudo bem no mundo. Em contraste, a crença psicopolítica é a de que pessoas se rebelam porque elas não estão bem. Rebeldes são diagnosticados como perturbados porque eles são tão problemáticos. Porque eles veem uma autoridade particular como injusta, é concluído que eles opõem toda autoridade estabelecida — o que não é o caso com a maior parte dos dissidentes políticos ou revolucionários. Para o psicólogo político, rebelião contra autoridade se torna uma evidência prima facie[4] de rebelião contra autoridade parental uma vez que esta foi removida. Não há necessidade de demonstrar a ligação; esta foi estabelecida por uma referência à “evidência clínica” que não possui comando sobre dados políticos, a menos que alguém presuma que o tenha.
A explicação psicológica, então, se apoia na falácia de “afirmar a consequência”: o rebelde político está realmente se rebelando contra autoridade parental: prova? O rebelde está se rebelando. Este problema se obtém em todas as teorias da “pulsão inata” [Innate drive] que pretendem explicar o comportamento observável. Então nos é dito que as pessoas são compelidas por uma pulsão por poder ou amor ou riqueza. A evidência para tais afirmações são então encontradas em instâncias de pessoas buscando poder, amor e riqueza. A teoria usa o próprio fenômeno que está tentando explicar como evidência de sua explicação.
Dados clínicos dúbios
À parte de como a “profunda” psicologia tem sido aplicada para a política, nós talvez possamos questionar sua confiabilidade como uma ciência. Ao fazer isso, nós compartilhamos da companhia de ninguém menos que Harold Lasswell, que admite que suas formulações são afirmadas em “uma forma um tanto quanto dogmática” e que eles se fundamentam na “natureza altamente insatisfatória dos materiais e métodos da psicopatologia contemporânea” (1930, p. XXV). Após trinta anos de trabalho psicanalítico, ele nota, ainda não existia um corpo de documentos que pudessem ser consultados por especialistas, os quais podiam resolver suas diferenças sobre o que acontecia em uma sessão de tratamento[5]. Notas tiradas das sessões de entrevistas são comumente inadequadas e inacessíveis. Ninguém sabe o “valor das sobras publicadas” ou quais processos distorcem as práticas de relatos de diferentes investigadores clínicos. E não há dados de acompanhamento de pós-tratamentos nas condições de clientes (Lasswell 1930, p. 205).
Como Lasswell não foi o primeiro a observar, pacientes tendem a produzir o tipo de material que o analista sugere. Portanto, eles sonhavam com figuras da anima, se analisados por Jung, reviviam traumas de nascimento se tratados por Rank, falavam de seus sentimentos de inferioridade para Adler, e lidavam com suas ansiedades Édipicas e medos de castração sob a supervisão de Freud. Então, diferentes investigadores, ostensivamente usando os mesmos métodos produziam dados diferentes ou chegavam a uma larga variedade de conclusões quando estavam olhando para os mesmos dados.
As regras para a atribuição de significado aos dados permanecem obscuras, como Lasswell aponta. Assim, quando alguém relata que foi avisado em sua infância que o seu nariz seria cortado se continuasse a “se tocar”, Lasswell pergunta: “Como sabemos que importância assinalar para esta dita reminiscência?”. Nós devemos aceitar isto como uma afirmação histórica ou nós devemos pensar nisso como uma fabricação que mostra o que ele acreditava que ia acontecer caso desobedecesse ordens? Seria a lembrança, Lasswell prossegue, apenas um sinal do medo do paciente de seu terapeuta sob forma da memória do passado? Ou talvez uma fantasia autoinfligida para punir a si mesmo por ter sentimentos hostis para com seu terapeuta? Ou uma tentativa de ganhar a aprovação de seu terapeuta ao produzir o que ele acha que o terapeuta acha importante? Ou um trauma original que, uma vez descoberto, irá diminuir a ansiedade do paciente? (1930, pp. 206-07)
Considere a questão da “formação reativa”[6], um dos “mecanismos de defesa do ego” a que os psicólogos políticos recorrem (e.g. Greenstein 1975, p. 84). Este conceito pode ser destacado como um exemplo emblemático que demonstra a natureza dúbia de muitos dos dados clínicos. Através da [ideia da] formação reativa, uma pessoa, da qual pode ser esperado que demonstre um tipo de comportamento, pode reagir distantemente do que era esperado até ao ponto de demonstrar um comportamento oposto. Por exemplo, pode ser esperado de alguém que essa pessoa manifeste hostilidade e ciúmes por um irmão, mas através da reação formativa irá demonstrar simpatia e lealdade — supostamente este é um caso de encobrimento psicológico compensatório de seus sentimentos negativos. Assim um clínico pode presumir que um motivo subjacente existe, e então pode encontrar evidência para isto em padrões de comportamento contrários (Eysenck, 1953). Tanto A quanto o exato oposto de A são utilizados como evidência da mesma coisa. Padrões diametralmente opostos podem ser tratados como capazes de evidenciarem a mesma afirmação teórica, tornando a teoria não-falseável [Irrefutável].
Mas como nós sabemos quando ações e atitudes possuem motivos inconscientes que são relacionados às experiências passadas? Quando elas são, se é que alguma vez são, o que elas parecem ser? (Até Freud, um fumante excessivo de charutos, afirmou que às vezes um charuto é apenas um charuto). Atrás de tais questões, há o problema da validação à espreita: como nós sabemos que estamos observando aquilo que dizemos que estamos observando — especialmente com relação às forças psíquicas submersas que por sua natureza não são observáveis? Além do mais, nós podemos pensar em uma ação individual e uma atitude como existindo apartadas da configuração maior das relações sociais? Se um certo comportamento é uma resposta para ambos os imperativos da realidade social e para os motivos psíquicos interiores, quanto peso que nós podemos atribuir para forças sociais maiores e quanto podemos atribuir à relação familiar? Por exemplo, o quanto podemos atribuir às condições de classe opressivas e o quanto podemos atribuir à conflitos entre pais e filhos? E o que nós devemos concluir de pronunciamentos sobre presidentes, profetas, e líderes revolucionários, sobre os quais os dados psicológicos são fragmentários e as possibilidades de investigação clínica são inexistentes, já que a maior parte dos líderes levaram seus sonhos e fantasias e seus conflitos ocultos para a cova junto com eles próprios? (Rogow 1968, p. 605)
Já que quase tudo sobre uma pessoa pode ser dotado de uma significância psicopatológica, o que decide o processo de seletividade e de polimento? Qual é o papel de coisas como ideologia, um desejo por justiça, interesses econômicos próprios da pessoa e ensinamentos éticos e religiosos? Podemos fazer uma interpretação confiável da patologia ao tratar o indivíduo como alguém relativamente intocado por estas forças maiores?
Se a psicologia está “por trás de tudo”, nós podemos nos perguntar se o psicológico possui algum limite. Parecendo permear tudo, ele perde o poder de discriminar cada coisa e sua capacidade de explicação. Mas características psicológicas não são substitutas para características sociais. Assim as pessoas regularmente percebem a realidade e agem sobre ela de acordo com a posição que elas ocupam na estrutura social, frequentemente porque não há outra maneira em que elas possam agir, nem mesmo se elas forem pessoas dotadas de personalidades excepcionais. Ainda se mantém como uma questão não resolvida se indivíduos que de fato agem de maneiras excepcionais estão o fazendo de tal forma por causa de emoções racionalizadas, deslocadas de necessidades de estágios anteriores de suas vidas, ao invés de uma série de outros motivos que têm a ver com talento, inteligência, vantagens familiares, habilidade, estupidez, interesses de classe ou o que quer que seja.
Lênin como Édipo
Para ilustrar alguns dos problemas já tocados, consideremos o estudo psicológico de Victor Wolfenstein feito sobre Lênin, vindo de seu livro feito sobre Lênin, Trotsky e Gandhi, três líderes que “acabaram tendo identidades revolucionárias como um resultado de conflitos intermináveis essencialmente com a autoridade parental” (Wolfenstein, 1967, p. 49).
Lênin foi criado em uma família que “não foi incomodada por qualquer estresse ou perturbação fora do usual”. Ela consistia de uma “considerável ninhada de crianças” que se davam bem (pp. 36-37). O pai de Lênin é descrito por Wolfenstein como um pai caloroso, paciente e amoroso, “que devotou uma substancial parte do seu tempo para gentilmente ensinar suas crianças como se comportar. Ele ensinou suas crianças como jogar xadrez, e jogava outros jogos com elas também” (p. 34). A mãe de Lênin é descrita como tendo uma disposição estável, relativamente bem educada, e “devotada ao bem-estar e o desenvolvimento das suas crianças”. Ela também passou uma boa parte do tempo com suas crianças, as ensinando a ler, tocar piano, liderando-as em cantigas familiares e ajudando-as a compor uma revista da família semanal escrita à mão (p. 35).
A imagem de Wolfenstein de Lênin é, também, em um geral positiva. Quando criança, Lênin parecia ter sido jovial, bem-humorado, escandaloso, um brincalhão “dado em algum nível a se gabar e ser um valentão [bully], mas como um todo bem amado e bem amável”. Ele facilmente ia bem nos trabalhos da escola e era estimado pelos professores. Em geral, Lênin era “um jovem brilhante e assertivo, mas não um rapaz fora do normal” (pp. 37-38). De onde vem o revolucionário patológico?
O problema, afinal, era que o pai de Lênin ocasionalmente mantinha-se distante de sua família por longos períodos de tempo por conta de suas obrigações oficiais. Esse padrão, de um pai amoroso e atencioso repentinamente se ausentando “deve ter tido um estranho efeito na mente do jovem Lênin” (p. 39). Wolfenstein não considera a possibilidade de que enquanto Lênin e as outras crianças talvez tenham sentido falta de seu pai durante suas viagens a trabalho, eles pareciam seguros o suficiente no seu afeto de modo que não reagiram com sentimentos profundos de abandono e traição.
Outro “problema”: o pai de Lênin nunca usou punição física nele, mas recorria à uma “firme persuasão moral” que deixou pouco espaço para “uma rebelião anti-paterna com uma clara consciência”. Aparentemente, Lenin teria sido criado melhor se seu pai tivesse o espancado ocasionalmente. A “alta retidão moral” do gentil pai “sem dúvidas resultou em um superego que demandava mais que o comum para o filho”, então o jovem Lênin provavelmente era incapaz de expressar o ressentimento que ele sentia pelo seu pai “sem sentir a culpa como uma consequência” (p. 39).
Mesmo antes de tudo isso, quando Lênin tinha apenas entre dezoito e vinte meses de vida, ele “já tinha desenvolvido uma natureza desconfiada”. Ele apenas começou a andar tardiamente, por necessidade de emular o comportamento de sua irmã recém-nascida com o objetivo de também receber a atenção materna que ela recebia. Essa demora em andar demonstrava uma desconfiança primeva de seu ambiente e demonstra que “O comportamento adulto de Lênin, acima de toda a sua desconfiança e toda a agressividade que nasce dessa desconfiança … Possuía raízes profundas em suas experiências de vida. Existia uma predisposição em direção a enxergar o mundo em uma situação de matar ou morrer.” (pp. 40-41). Wolfenstein não revela como ele chegou a essas conclusões de tirar o fôlego.
A identificação amorosa de Lênin com seu irmão mais velho e seu pai — frequentemente expressa por ele próprio tanto verbalmente quanto na forma que ele emulava ambos — se torna outra fonte de patologia nas mãos de Wolfenstein. A morte do pai e do irmão, parece, evocou intenso sentimento de culpa em Lênin que, de acordo com Wolfenstein, nutria uma ambivalência de amor e ódio por ambos os homens mais velhos que era “o problema central de sua vida”. Wolfenstein eventualmente baixa o estrondo freudiano; “Lênin, devemos relembrar, sentiu recair sobre ele uma dupla responsabilidade pelas mortes de seu pai e de seu irmão — os quais ele desejava que morressem para que ele próprio pudesse possuir sua mãe” (p. 113).
O que está em falta é qualquer evidência que Lênin nutria tais sentimentos de culpa, agressão, ambivalência, ódio e de assassinato em relação ao seu irmão e ao seu pai e de amor incestuoso pela sua mãe[7]. Nem, para Wolfenstein, é necessária qualquer evidência, já que o Complexo de Édipo foi declarado como algo universal, parte de toda herança psíquica de qualquer filho. Então uma aflição comum é utilizada para explicar um homem muito incomum. Alguém pode se perguntar por qual razão Wolfenstein ainda se deu ao trabalho de construir as outras interpretações quando ele podia ter aplicado desde o início, tirando isso do nada, o julgamento Edipiano pré-fabricado.
Wolfenstein parece sugerir que o Marxismo revolucionário foi a cura terapêutica para a psicopatologia que Lênin sofria. Lênin encontrou um “pai benevolente e onisciente” em Marx e um “pai vingativo Edipiano no Czar”, sobre o qual, porém, Marx prometia a vitória (p. 117).
Esse trato de Lênin convida a crítica oferecida anteriormente de que quase qualquer coisa sobre uma pessoa pode ser dotada de significância psicopatológica e então entrelaçada a sua vida política. Tanto A quanto o oposto de A podem ser tratados como evidência de uma patologia. Tanto um pai amoroso e gentil quanto um pai severo e desamoroso, tanto uma identificação positiva com figuras familiais quanto identificações negativas. E às vezes nenhum dado sequer irá se encaixar tão bem quanto quando evocamos a maldição universal edipiana. O comportamento durante a vida adulta é presumido ter sua motivação tirada não de uma busca por justiça ou um desejo por um mundo melhor, mas por encenar cenários não resolvidos anteriormente. Mesmo se um indivíduo como Lênin cria um teatro novo e maior em seus engajamentos na vida, na visão psicopatológica, ele ainda está fadado a um roteiro antigo, uma vítima desafortunada de uma demonologia interior que necessita de uma vida inteira e às vezes uma revolução inteira para uma execução apropriada de seu exorcismo.
A Falácia Genérica
Descobrir uma necessidade psicológica em personagens políticos nos diz muito pouco sobre a significância política do que eles estão fazendo. No entanto, a explicação psicopatológica de fato lança uma dúvida sobre as questões políticas. Uma vez convencidos que revolucionários são impelidos por sentimentos não resolvidos com seus pais, nós não podemos evitar a dúvida sobre o valor da revolução em si própria — mesmo que nada tenha sido estabelecido sobre as questões substantivas da revolução. Quando Bettelheim ou outros reduzem o movimento de protesto dos estudantes a uma guilt trip [sentimentos de culpa] coletiva ou a uma desordem infantil ou adolescente, o inevitável impacto é o de desvalorizar o protesto, fazendo daqueles manifestantes o próprio ponto do protesto, ao invés da pauta contra a qual se manifestam.
Esta forma de argumentum ad hominem[8] nos diz muito pouco, se é que nos diz algo, sobre o valor político de uma questão ou de uma ação. Nós poderíamos decidir que as pessoas se opõem à Guerra do Vietnã porque elas (a) possuem um ódio por autoridades mal direcionado e irracional ou (b) porque elas possuem um senso de justiça e um amor pela paz. E nós poderíamos concluir que as pessoas apoiam a guerra por conta de (c) amor pelo país e um desejo por parar o comunismo ou (d) um gosto por atividades violentas. Mas nenhuma dessas coisas nos traz para uma posição informada sobre a guerra em si, pois a questão de apoiar ou opor-se a intervenção armada como política se mantém em um corpo de dados que se estende além dos motivos internos de participantes particulares.
Pessoas envolvidas em protestos públicos são comumente acusadas de estarem apenas buscando escapar do tédio ou de estarem extravasando sua raiva, ou qualquer outra coisa. De fato, pessoas politicamente ativas algumas vezes se sentem mais engajadas na vida. Comunistas, revolucionários, liberais, centristas, conservadores, reacionários e fascistas, todos já testemunharam o revigoramento experimentado no engajamento político ativo, especialmente quando os esforços trazem resultados, mas isso não nos diz nada sobre o valor político das suas ações particulares e de suas ideologias. Em resumo, motivações pessoais — opostas às motivações políticas — são, se não irrelevantes, certamente de importância marginal para avaliar a política pública.
Hoover, o Compulsivo
A psicopolítica não é apenas uma questão de pesquisadores mainstream [da corrente dominante] psicologizando rebeldes. Pessoas de orientações liberais e centristas analisaram presidentes dos EUA e líderes conservadores. Os resultados são dificilmente mais estimulantes do que o trato destinado aos radicais[9]. Consideremos um dos melhores psicólogos políticos, James David Barber, especificamente no seu trato de Herbert Hoover, um homem que ele categoriza como um “presidente ativo-negativo”[10]. O presidente ativo-negativo é aquele que experimenta uma severa privação durante sua infância e que subsequentemente tenta espremer do seu ambiente um senso de autovalorização através de suas conquistas e uma busca por poder sobre os outros (Barber, 1972, pp. 99-100). De acordo com Barber, Hoover sofria de uma falha fundamental de caráter que fez com que ele perdesse uma flexibilidade anterior em sua vida por uma rigidez autoderrotista e uma compulsão de um estágio mais avançado de sua vida. Quem teria previsto, Barber pergunta, “que Herbet Hoover, o trabalhador pragmático e miraculoso que negociou fundos de ajuda para uma Europa destruída pela guerra no meio da Primeira Guerra Mundial, iria se paralisar em oposição aos fundos para aliviar os estadunidenses desempregados?” (Barber, 1973).
Barber nos informa que Hoover se tornou órfão com a tenra idade de oito anos, viveu com seus parentes, gostava do ar livre e de ficar fora de casa, e teve uma criação que dava grande importância “para uma contenção fechada de suas emoções”. Barber propõe que, quando criança, Hoover foi marcado pela perda de seus pais e experimentou “um sentimento de impotência, uma inabilidade de guiar seu próprio caminho, uma vulnerabilidade para com as mudanças radicais externas em sua vida” (Barber, 1972, 128-129). Para superar esses sentimentos, ele lutou para estabelecer controle sobre o mundo ao seu redor, um padrão que persistiu até na faculdade, onde ele também supostamente manifestou um “extremo individualismo”. Na realidade, baseado nos dados que Barber apresenta, é possível concluir que Hoover se demonstrou capaz de trabalhar em uníssono com seus colegas de classe, tinha um número normal de amizades, demonstrava habilidades excepcionais como um organizador estudantil e exercia uma efetiva liderança no campus. Se é possível afirmar algo, é que na Universidade de Stanford, Hoover desenvolveu seus talentos excepcionais em formas aparentemente criativas e de maneiras auto-recompensadoras.
Barber acredita que as falhas fatais no caráter de Hoover vieram à tona de forma mais pronunciada quando ele estava na Casa Branca. Como presidente, Hoover parecia estar tentando “compensar algo, buscando recuperar algo através da liderança, alguma coisa perdida ou alguma parte danificada de si mesmo” e parecia lutar “contra um sentimento interno de inadequação”. “A sua busca por poder refletia uma forte necessidade compensatória pelo poder”. Assim como outros presidentes ativos-negativos como Wilson e Johnson, de acordo com Barber, Hoover nutria “uma necessidade sentida pela negação e de autogratificação” (Um traço que eu acho difícil de imaginar em Lyndon Johnson)[11]. Hoover “lutava para controlar seus impulsos agressivos” e era um perfeccionista que “deveria ser bom em tudo, a todo tempo”. Na realidade, o próprio Hoover tinha uma visão não-perfeccionista das suas próprias limitações. Por isso ele se recusou a tentar se sobressair em todos os cargos da sua presidência. Ele não tentou cumprir as necessidades dramáticas do cargo, comentando em uma ocasião “Você não pode fazer de mim um Teddy Roosevelt” (1972, p. 69).
Barber nos conta que Hoover era um homem bloqueado emocionalmente, de poucas palavras, sem-humor, reservado e raramente capaz de chorar. Mas a evidência escassa que ele oferece parece contradizer esta imagem. Hoover podia demonstrar raiva, assim como em uma ocasião ele ameaçou lutar com um heckler[12] na campanha de 1932. Hoover podia chorar. Barber cita dois momentos em que ele se comoveu e chorou em público. (O quão comum é esperar de um presidente bloqueado emocionalmente chorar em público?) E Hoover foi profundamente movido, tanto emocionalmente quanto na ação, quando foi visitado na Casa Branca por três crianças que pediram para que seu pai, que estava desempregado, fosse solto da cadeia. Curiosamente, o único testemunho contemporâneo que Barber oferece é o de Eugene Lyons que disse que Hoover não era frio, mas sim “uma pessoa sensível, de coração mole que deseja afeição, que gosta de uma companhia agradável e que sofre dos ataques da malícia” (pp. 77-78).
Em resumo, os dados que Barber oferece sobre a vida de Hoover não são apenas imprecisos e seletivos, como eles próprios se prestam a uma interpretação contrária. Ele falha em criar uma argumentação convincente de que os traços que ele imputa a Hoover são os componentes dominantes do seu caráter ou que são dotados com o significado que ele atribui a eles. A consequência disso é que, após ler sua obra, podemos sentir que Barber nos diz ao invés de nos demonstrar. E nós ficamos nos perguntando: como ele sabe disso?
O Político Hoover
A pergunta de Barber permanece: como podia Hoover, o homem que administrou a ajuda para as crianças de uma Europa devastada pela guerra, se recusar a alocar fundos de ajuda para aliviar a fome de milhões de estadunidenses durante a Grande Depressão, assim ajudando a causar o fim da sua própria presidência? Antes de propor alguma compulsão ideológica, vamos investigar o Hoover político, pois aí pode estar as pistas para seu comportamento político.
Quando Hoover era presidente, ele uma vez disse “A única função do governo é trazer as condições favoráveis para o desenvolvimento benéfico da iniciativa privada” (Barber, 1972, p. 74). De fato, uma olhada na carreira de Hoover revela uma consistente dedicação de toda uma vida para o sistema da iniciativa privada, seja em seu país ou alhures. Como chefe da organização privada, a Commission for Relief in Belgium [Comissão para Ajuda na Bélgica], e mais tarde como diretor da American Relief Administration [Administração Americana de Ajuda], Hoover concedeu ajuda humanitária de uma forma altamente oportunista. Sua comissão não deu comida para os belgas, ela vendeu comida para os belgas por dinheiro em preços pareados com os do período [que era um período de guerra], como se os suprimentos tivessem sido comprados no livre mercado. A Bélgica foi drenada de seus fundos em troca de comida. Entre os belgas que não podiam pagar, uma escassez severa surgiu por volta de 1916, seguida por motins e protestos de fome entre as classes mais pobres (Knox, 1932, p. 115; Hamill, 1931, pp. 327-328).
Ainda em novembro de 1918, Hoover deixou claro que a comida era para ser usada como uma arma política “para travar a onda do Bolchevismo” (Weissman, 1974, p. 29). Quando a American Relief Administration de Hoover mandou ajuda para a Rússia, era com um propósito nunca pretendido pelo Congresso, para áreas ocupadas pelo Exército da Guarda Branca do General Yudenich, e nos Bálticos para áreas ocupadas pelas Tropas Expedicionárias Alemãs do General von der Goltz[13]. Ambos estes exércitos estavam dedicados a derrubar o governo Soviético, e ambos praticavam pilhagens e execuções de civis de forma generalizada. Já em 1919, o exército de Yudenich subsistia completamente pelo apoio de Hoover (Weissman, 1974, pp. 36-37; Sayers e Kahn 1946, p. 106). Em um relatório para o Congresso em janeiro de 1921, Hoover admitiu utilizar fundos de ajuda dos EUA para abastecer os reacionários Exércitos Brancos (Liggett, 1932, pp. 260-267). Sua maneira de distribuir ajuda fez com o que o Nation (7 de Junho, 1919) criticasse ele editorialmente por se recusar a distribuir toneladas de comida para habitantes famélicos da Rússia até “que eles se rendessem às ideias e aos exércitos” dos poderes ocidentais.
De forma similar, Hoover reteve ajuda financeira e alimentícia planejada para a Hungria até que o curto governo revolucionário de Béla Kun fosse derrubado — mesmo que esses suprimentos tivessem sido comprados com fundos fornecidos por esse governo. Ajuda humanitária só foi acessível após o almirante Horthy ser instalado, apoiado pelas baionetas do exército Romeno, que instituiu um “terror branco”, executando centenas de revolucionários húngaros e judeus (Ligget, 1932, p. 255; Weissman 1974, p. 215).
No mesmo espírito, Hoover caracterizou seus esforços de ajuda em apoio do governo patrocinado pelos Aliados na Áustria como uma “corrida contra ambos a morte e o Comunismo”. Ele mandou colocar cartazes por toda Viena anunciando que as remessas de comida iriam cessar caso ocorresse uma insurreição. Ele também alocou grandes quantias sob a disposição dos militaristas poloneses de direita durante a sua invasão da Rússia Soviética em abril de 1920. O senador James Reed do Missouri apontou no Senado que 40 milhões de dólares dos fundos de ajuda que o Congresso havia aprovado para ajudar os famélicos “eram gastos mantendo o Exército Polonês no campo” (Sayers e Kahn 1946, p. 93; Weissman, 1974, p. 37). O psicólogo político Alexander George (1974, p. 257) descreveu Hoover como um “humanitário sincero”. Ele pode ser descrito melhor como um “humanitário seletivo”, capaz de usar ou de reter fundos como a ideologia política ditava.
Enquanto era saudado como alguém que fazia o bem, Herbet Hoover foi bem. Frequentemente descrito como um “engenheiro”, ele era na realidade um multimilionário com empreendimentos no Myanmar, na Nigéria, na Austrália, na África do Sul, na Nicarágua, nos Estados Unidos e na Rússia Czarista. Antes da Primeira Guerra Mundial, ele havia assegurado um grande investimento em não menos que onze corporações russas de petróleo, junto com grandes concessões em florestas madeireiras russas, minas russas, ferrovias russas, refinarias russas e reservas russas de ouro, cobre, prata e zinco (Hamill, 1931, pp. 298-300; Knox 1932, pp. 97-99). Se a Revolução de Outubro não tivesse ocorrido e o governo bolchevique não tivesse cancelado as vastas concessões, Hoover seria um dos maiores bilionários do mundo. Seja motivado pelos interesses de seus investimentos pessoais ou por um interesse de classe mais generalizado ou por um conservadorismo ideológico ou ainda algum tipo de mistura destas possibilidades — e não há razão alguma para presumir que elas são mutuamente exclusivas — Hoover manifestava uma militância inabalável contra o comunismo e contra qualquer mudança revolucionária que talvez limitassem as prerrogativas da empresa privada. Durante o período depois da Revolução Russa, ele se manteve um apoiador persistente das campanhas militares contra a Rússia Soviética[14].
Durante seu mandato como presidente, Hoover expressou múltiplas vezes sua oposição à propriedade pública e à regulação do governo sobre a economia. Na época da depressão, líderes políticos e corporativos estavam divididos sobre qual estratégia deveriam seguir diante do colapso econômico e da crescente insatisfação pública. Havia aqueles que advogavam por reformas na esperança de que, ao dar um pouco, eles pudessem manter muito. Outros acreditavam que não devia se interferir com o sistema de empresas privadas, que os relatos de sofrimento da população eram altamente exagerados, e que a economia estava basicamente sadia e que ela logo iria se endireitar.
Hoover estava firmemente no segundo grupo. O que Barber considera ser a sua “paralisia”, “inflexibilidade” e “compulsão”, eram atitudes não pessoais a ele. Em sua recusa a gastar bilhões necessários para aplacar os apuros dos destituídos, Hoover compartilhava de uma opinião que prevaleceu dentro da maior parte das comunidades de negócios até um pouco antes de 1932 e até mesmo depois. Assim como muitos outros conservadores antes e agora, Hoover pregava as virtudes da independência financeira, oposição a taxação de lucros corporativos no além-mar [remessa de lucros], procurava reduzir imposto de renda para as classes mais altas, e se opunha aos bônus para veteranos e ajuda para aqueles que sofriam com as secas. Ele negou verbas federais para os desempregados, se opôs ao seguro-desemprego e aos benefícios federais para aposentados. Ele, repetidas vezes, avisou que programas de assistência pública eram o começo do “socialismo de estado” (Liggett, 1932; Warren, 1959). Para os negócios, contudo, ele não sofria de tal “inflexibilidade” e podia gastar generosamente. Ele apoiou subsídios multimilionários para os interesses da indústria naval e do agronegócio, e sua Reconstruction Finance Corporation [Corporação de Reconstrução de Finanças] doaram alguns bilhões de dólares para bancos e corporações.
As informações acima, todas de domínio público, nos provêm com um retrato diferente daquele esboçado por Barber. Ao invés de ir da flexibilidade para a rigidez por causa de uma falha psicológica, Hoover manteve a posição que era consistentemente alinhada com a sua ideologia de classe, uma posição compartilhada pela maioria dos membros de sua classe. Como um administrador da verba para emergência, ele usou a ajuda humanitária para apoiar governos capitalistas autocráticos e exércitos, enquanto esfomeava governos revolucionários e movimentos revolucionários na Europa Central e no Leste Europeu, conciliando muito pouco mesmo diante das repetidas críticas do Congresso e da mídia.
O homem que, por motivos políticos, poderia reter verbas de populações famélicas no Leste Europeu e na Rússia Soviética, podia, por motivos políticos, negar ajuda humanitária para trabalhadores estadunidenses. Tendo lutado na década anterior contra revoluções socialistas na Áustria, Hungria, no Báltico e na Rússia, o presidente Hoover não iria introduzir o que ele e muitos de seus apoiadores consideravam ser uma das traiçoeiras formas do socialismo em casa. (Até mesmo aqui, a “rigidez caracteriológica” de Hoover deu caminho para sua conveniência política quando enfrentado com uma eleição nacional, ele tardiamente se moveu na direção de uma ajuda federal no verão de 1932).
Em suma, o mistério sobre o caráter de Hoover parece não ser mistério algum. Herbert Hoover era, e muito, um animal político. Inflexível e intransigente ele podia ser, mas de uma maneira politicamente ligada aos seus próprios interesses. O “trabalhador pragmático e miraculoso”, que supostamente foi travado de repente por uma compulsão quando estava na Casa Branca, era no final das contas um linha-dura, anticomunista, conservador multimilionário que operava de uma forma ideologicamente consistente, tomando posições de classe que até hoje não são estranhas [ao público]. Em nome das coisas nas quais ele acreditava e valorizava, Hoover sabia o que ele estava fazendo (Que ele estava agindo racionalmente não quer dizer que ele agiu de forma infalível. Certamente pode ser debatido que eventos subsequentes demonstraram o quão errado ele e seus apoiadores estavam sobre ambas as condições econômicas e sobre a vontade popular).
Mais uma vez nós vemos que a explicação psicológica atinge uma plausibilidade apenas ao menosprezar — ao invés de explicar — realidades políticas importantes.
Invertendo Lasswell: o Político Afeta o Pessoal
O modelo Lasswelliano presume que já que a infância antecede a vida adulta, ela cria uma ligação mais forte e de maior duração que as experiências da vida adulta. Essa progressão presumida de uma infância formativa-apolítica para uma maioridade política-reativa trata o indivíduo como uma entidade genérica, uma noção compatível com o modelo liberal de uma sociedade de mercado como um conjunto de indivíduos agindo conforme seus desejos e demandas, assim moldando a realidade maior de acordo com seus desejos privados.
Mas o que é primário na linha de tempo não é necessariamente primário no poder formativo. A primazia cronológica talvez não seja uma indicação indubitável de eficácia primaz. Para muitos fenômenos políticos importantes, poderia se qualificar seriamente a fórmula Lasswelliana e argumentar que a progressão causal ocorre em ambos os sentidos. Há numerosos estudos indicando que as ansiedades geradas durante tempos de escalonamento nuclear e embates da Guerra Fria penetram as mentes inconscientes de crianças estadunidenses, investindo muitos jovens com prognósticos alarmantemente pessimistas sobre a sobrevivência da humanidade (Beardslee e Mack, 1982 e 1983; Yudkin, 1984; Escalona 1965). Outros desenvolvimentos políticos como recessão, desemprego, pobreza, perda de renda familiar, repressão policial, assassinatos políticos e guerra têm um impacto perceptível nas disposições psíquicas de populações inteiras de adultos e de crianças (Brenner, 1973; Bernstein, 1970; Brown e Harris, 1978).
Colocar uma infância apolítica como o antecedente crucial para uma maioridade política é ignorar o fato de que a infância é provavelmente tão apolítica quanto o resto da vida. O fato de que crianças estadunidenses não são usualmente ativas na vida política não quer dizer que elas são isoladas de seus efeitos formativos. Na realidade, elas são submetidas a uma socialização inicial política e ideológica através da televisão, de filmes, da escola primária, da comunidade e das experiências sociais e dos preconceitos aos quais elas são expostas na família em si. Muito da literatura de socialização política indica que a família está longe de ser apolítica e que ela tem um impacto importante nas lealdades políticas — não através do tortuoso caminho da ontologia psicopatológica, mas mais diretamente como um mediador socializante das opiniões políticas, imagens sociais, papéis de gênero, atitudes raciais e valores de classe.
Tudo o que isso sugere que a socialização e a internalização talvez sejam mecanismos mais cruciais do que deslocamento e racionalização para vincular o mundo público e o mundo privado. Colocando Lasswell ao contrário, nossa fórmula pode ser lida como: P} s} i} = p. Forças políticas, P, possuem um efeito socializante, s, em indivíduos que através de um processo de internalização, i, abraçam imagens particulares e interesses da vida política de tal forma que essas se tornem componentes atraentes dos seus motivos privados, p. Eu afirmo que o poder de explicação deste modelo é maior e menos misterioso do que o modelo Lasswelliano. Ele necessita de menos suposições enfeitadas; ele é apoiado pela evidência mais prontamente disponível e por interpretações desprovidas de extrapolações elásticas encontradas na psicopolítica. Ele reconhece que indivíduos e famílias não precedem a realidade social na qual eles nascem e nem existem em um vácuo pré-político.
Pela Política
Focar muito rigorosamente na personalidade nos faz negligenciar e não olhar os imperativos institucionais maiores do poder e os interesses que moldam nossas opções e nossas performances. Mas uma visão puramente estruturalista deixa de fora o papel crucial que as personalidades individuais ou a psicologia de grupos podem tomar. Em outras palavras, nós não deveríamos argumentar contra aqueles que afirmam que personalidades diferentes possam, sob certas circunstâncias, ter um efeito sobre resultados políticos e sociais diferentes. Mas é uma coisa dizer que a personalidade possa talvez afetar a realidade — quem pode negar o impacto de um Lênin ou de um Gandhi — e algo inteiramente diferente argumentar que atores políticos, ambos líderes e as massas, estão deslocando suas agendas psicológicas escondidas e não resolvidas para a vida política. É esta última afirmação que eu critiquei, sem o desejo de dispensar por completo o papel dos fatores psicológicos no timing [na sincronia], na formulação e na expressão de ações políticas. Após fazer algumas correlações de atitudes políticas, sociais e psicológicas, Sutherland e Tannenbaum (1984, pp. 177, 194) concluem que:
Cientistas políticos que estudam preferências políticas de massas em relação às dimensões “básicas” da personalidade … Estão explorando uma área de potencial negligível… Provavelmente será demonstrado que preferências políticas têm origem na “cognição” racionalmente obtida sobre como a sociedade em si funciona, ao invés das necessidades da personalidade profundamente enraizadas … Parece óbvio que “personólogos” na ciência política têm se precipitado ao focar nos supostos efeitos das variáveis da “personalidade” como eficácia política e autoritarismo, que se demonstraram serem reflexos baseados em suas classes.
Em suma, a psicopolítica tende a reduzir um grande fenômeno social às simples causalidades pessoais. É reducionista, embora de uma maneira tortuosamente indireta, já que a psicopolítica toma um caminho elaborado e complicado, preferindo explicações que são distantes dos eventos e das realidades para as quais as explicações são destinadas. A psicopolítica tende a subestimar o conteúdo manifestado. É simplista na sua interpretação e altamente esotérico e rarefeito na natureza de sua evidência (ou não-evidência) sobre a qual se ergue.
Ao inverter Lasswell, eu não estou afirmando que a causalidade formativa vai apenas do político para o privado, mas que nós podemos dar uma nova definição ao privado, reconhecendo suas dimensões sociais. Certamente as pessoas não absorvem passivamente as forças político-econômicas. As pessoas sintetizam, desafiam e até mesmo criam coisas novas em sua experiência social. Mas a literatura existente sobre a psicopolítica é muito profundamente defeituosa para ser de alguma ajuda ao entender as realidades políticas.
Tendo tomado nota da inacessibilidade de dados confiáveis e a abundância de interpretações questionáveis, ambos na ciência da profundidade psicológica e em suas aplicações políticas, e tendo notado a tênue e aparentemente arbitrária ligação das causalidades, a forma como conclusões arrebatadoras que podem estar apoiadas sobre suposições frágeis, e a maneira com que os dados políticos são menosprezados, nós podemos ser perdoados se escolhermos não trilhar o caminho aberto pelos praticantes da psicopolítica. Eles prometeram a nós um jardim secreto e ao invés disso nos deram um pântano.
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Notas
[1] N.T.: self quer dizer “de si mesmo” o “eu” ou “a si mesmo”, neste contexto ela está empregada pelo uso do termo da psicanálise.
[2] N.T.: protestos contra a brutal guerra do Vietnã, que matou mais de 2 milhões de vietnamitas, só durante o período que os EUA estiveram à frente de toda a logística militar e financiamento da guerra.
[3] N.T.: O autor utiliza o termo “carpet bombing”. O carpet bombing ou saturation bombing é uma tática de guerra de um “Bombardeio denso, concentrado contra uma área limitada que se deseja arrasar“ segundo o Glossário de Termos e Expressões para uso no Exército e é considerado um crime de guerra se utilizado contra aglomerações civis, o que os EUA fizeram amplamente na Indochina, ao ponto de que nas operações na Indochina (Laos, Vietnã, Camboja) foram lançadas mais bombas do que no total da Segunda Guerra Mundial inteira, somando todos os lados e em todos os teatros de operação.
[4] N.T.: prima facie é uma expressão latina que significa “à primeira vista” ou “de primeira”.
[5] N.A.: Cinquenta e nove anos após Lasswell fazer esta observação, a American Psychiatric Press (Imprensa Psiquiátrica Americana) publicou um trabalho de referência de quatro volumes com o objetivo de ser um manual para tratamento. Esta obra de referência contem contribuições feitas por mais de quatrocentos especialistas, em sua grande parte psiquiatras, e parece estar perto do corpo documental que Lasswell imaginou que deveria estar disponível para especialistas para consulta. Mas o trabalho evocou uma controvérsia acalorada, incluindo reclamações de psicólogos que sentiram que certas teorias estavam sendo menosprezadas e que novas aproximações seriam desencorajadas. O manual foi publicado com um aviso [disclaimer] dizendo que não era uma publicação oficial da Associação Psiquiátrica Americana [American Psychiatric Association] (Task Force on Treatments and Psychiatric Disorders, 1989).
[6] N.T.: segundo a Wikipédia, “Formação reativa, na teoria psicanalítica, é um mecanismo de defesa no qual emoções e impulsos próprios que produzem ansiedade ou que são percebidos como inaceitáveis são dominados por um comportamento exagerado de tendência diretamente oposta (..)”. Disponível em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Forma%C3%A7%C3%A3o_reativa >
[7] N.A.: Para uma visão amplamente diferente da personalidade adulta de Lênin, ver os retratos contemporâneos escritos por Krupskaya (Memórias de Lênin, 2021, Ruptura Editorial) e Trotsky (Lenine, disponível em <https://www.marxists.org/portugues/trotsky/1924/lenine/index.htm>).
[8] N.T.: Significa “argumento contra a pessoa”, é uma forma de falácia argumentativa em que se ataca o argumentador, não o argumento.
[9] N.A.: Ver, por exemplo, Wolfenstein (1967), Chesen (1973), Abrahamsen (1977), Brodie (1973), Clinch (1973), Mazlish (1973). Para uma crítica de Clinch e de Mazlish ver Coles (1987, pp. 96-99, pp. 102-04). Barber (1972), que será tratado nas páginas adiante, acredito representar um dos mais fortes esforços na psicologia política. Outro trabalho digno de atenção respeitosa, mas também merecedor de algumas das mesmas críticas aqui feitas, é o de George e George (1964); ver as críticas de George e George por Tucker (1977) e Weinstein, Anderson e Link (1978-790 e a resposta por George e George (1981-82), todos reimpressos por Cocks and Crosby (1987).
[10] N.T.: segundo a Wikipédia, James David Barber define em seu livro “The Presidential Character” (O Caráter Presidencial) um “presidente ativo-negativo” como um presidente com “prontidão para a ação, alto otimismo, e um carinho pela presidência”.
[11]N.A.: A afirmação que presidentes com personalidades ostensivamente diferentes como Wilson, Nixon, Johnson e Hoover são “extremamente similares em caráter” (Barber, 1973) levanta a dúvida sobre o uso de “caráter” como um construto psicológico e de sua relação com a personalidade. Se nós pensamos em “personalidade” no sentido leigo que quer dizer as expressões observáveis do temperamento e da atitude, e “caráter” no sentido mais clínico como “a forma da reação típica” utilizada por indivíduos para mediar a realidade e o conflito psíquico (Reich, 1969) ou o sentido desenvolvido mais anteriormente e ainda de uso duradouro “postura com relação à vida” (Barber, 1972, p. 10), então a afirmação que essas quatro personalidades presidenciais que são um tanto quanto diferentes são de um caráter similar não é uma afirmação impossível de fazer. Mas poderia ser estabelecido apenas por uma análise aprofundada dos quatro presidentes, algo que claramente não foi feito. A topologia do caráter de Barber lida não apenas com as manifestações superficiais da atividade-passividade e expressões da positividade-negatividade, mas padrões psicodinâmicos mais profundos. Como George assinala, “os dados não são sempre bons” para apoiar a afirmação de Barber de que um estilo presidencial particular também contém as psicodinâmicas mais profundas com as quais Barber as associa (George 1974, p. 251). Ambos Lasswell e Barber enfatizam a especificidade biográfica de algum sentimento ou experiência deslocado e racionalizado vindos da infância, e outros momentos recorrem aos modos de resposta mais habituais e estruturados que são o que Willhelm Reich chamou da forma “caracterológica” do indivíduo de mediar entre a vida externa e o eu interior (Reich, 1969). Em uma palavra, os psicólogos políticos estão lidando com ambas a psicologia do desenvolvimento e a psicologia adaptativa do ego, recorrendo ora às características idiossincráticas da história psíquica do indivíduo ora às formas generalizáveis das defesas do ego. Greenstein (1975) nota que essas são abordagens interligadas, mas conceitualmente separadas. Porém como foram aplicadas às psicobiografias políticas, não é sempre claro o porquê ou quando deveria ser uma ou outra.
[12] N.T.: “Heckler” é aquela pessoa da audiência que atrapalha um show, uma apresentação ou um discurso ocorrendo num palco.
[13] N.T.: Aqui Parenti cita dois nomes envolvidos tanto na Primeira Guerra Mundial, quanto na assim chamada Guerra Civil Russa (Na qual houve a invasão direta ou a interferência de mais de 10 potencias ocidentais), do general da Guarda Branca Nikolai Yudenich e do general da Divisão do Mar Báltico Rüdiger von der Goltz. Para entender melhor e mais profundamente a brutalidade praticada pelos exércitos invasores da experiência soviética em seu momento formativo citadas de forma en passant pelo autor, recomenda-se a leitura do prefácio de Rodrigo Ianhez e das memórias de guerra de diversos soldados, ambos organizados por Matheus Gusev no livro Diários Vermelhos: a Guerra Civil Russa (Ruptura Editorial, 2022).
[14] N.A.: Hoover eventualmente ofereceu ajuda à Rússia Soviética durante o governo bolchevique ”de uma maneira mais desonesta do que uma franca contrarrevolução” (Filene, 1967, p. 78). Hoover acreditava que os Bolcheviques estavam prestes a perder a mão no seu reino do poder. A esperança era de que um grande corpo de ajuda internacional fosse capaz de tomar controle econômico da Rússia Soviética, no que se tornou conhecido como uma ”intervenção do pão” (Weissman, 1974, pp. 44-45, pp. 49-51). Em um memorando ao presidente Wilson (Um que parece notavelmente contemporâneo de sua abordagem de contrainsurgência), Hoover demonstrou que a contenção do comunismo estava no topo de seus pensamentos. Ele mapeou como a ajuda poderia servir para moderar a militância de um novo governo revolucionário, especialmente depois que uma ”amarga experiência tivesse ensinado as tolices econômicas e sociais das presentes obsessões [revolucionárias]” (Fisher, 1927, pp. 11-14). Dentro de dois anos após o programa alimentício ter começado, quando se tornou evidente que os Soviéticos não estavam prestes a colapsar ou de serem subvertidos, Hoover cancelou abruptamente toda ajuda à Rússia enquanto continuava a prestar assistência à regimes conservadores na Áustria, na Polônia e na Tchecoslováquia.