As causas de um desfecho inevitável. Notas sobre a crise do PCPE

Por Raúl Martinez Turrero, via El Machete, traduzido por Carlos Motta

Escrito em outubro de 2017 pelo então Secretário do Comitê Central do PCPE, Raúl Martinez Turrero, este artigo sintetiza o desenrolar da crise do Partido Comunista dos Povos da Espanha. Por um longo período após o início dessa crise, dois comitês centrais distintos se formaram, ambos utilizando o nome PCPE – até que a maioria dos camaradas dispostos a levar até o fim a reconstrução revolucionária do movimento comunista espanhol decidiram pôr fim a esta crise adotando um novo novo, PCTE (Partido Comunista dos Trabalhadores da Espanha). Escrito antes do congresso que autorizou a mudança de nome, o texto dá conta dos principais aspectos ideológicos e práticos das divergências crescentes que produziram essa crise.

À guisa de introdução

Em 22 de abril, uma grave crise estourou dentro do Partido Comunista dos Povos da Espanha. O Comitê Central do Partido não se reuniu. Diante da tentativa de impor flagrantes violações estatutárias, dois grupos realizaram sessões separadas que, ao final, se declararam irreconciliáveis: de um lado, os que reconheceram Carmelo Suárez como secretário-geral do partido; por outro, que, representando a maioria militante do PCPE e do CJC, nomeou o camarada Ástor García como secretário-geral do Partido, que ocupou o Secretariado Internacional até o X Congresso do Partido.

Desde então, a prática tem confirmado que profundas causas político-ideológicas se escondiam por trás da crise vivida, o que logo foi revelado pelo grupo que segue Carmelo Suárez e Julio Díaz, ao qual nos referiremos a partir de agora como o grupo Suárez-Díaz, no seio do Movimento Comunista Internacional: aqueles que até pouco antes haviam sido partidos irmãos, como o Partido Comunista do México ou o Partido Comunista da Grécia, passaram a estar no centro das atenções do grupo Suárez-Díaz, amigos de ontem tornaram-se o inimigo a vencer.

Longe do que foi proclamado pela fração de Carmelo Suárez, não é preciso buscar as causas da ruptura em terras gregas ou mexicanas. Não houve “operação internacional” para atacar o PCPE. Nosso Partido foi vítima de suas próprias contradições internas. A verdade é que dentro do PCPE havia um intenso debate político-ideológico sobre diferentes aspectos da luta de classes, bem como debates internos relacionados à própria construção do PCPE e profundamente ancorados na história do movimento comunista espanhol. Obviamente, esses debates estiveram e estão relacionados com algumas das questões candentes que o Movimento Comunista Internacional discute hoje, mas as causas fundamentais da demarcação produzida, como se tentará expor nas linhas seguintes, foram essencialmente internas.

Agradecemos à redação do El Machete o convite para escrever este artigo, esperando que seja útil para a militância comunista mexicana compreender as profundas causas ideológicas de uma crise na qual, infelizmente e como a militância de outros partidos irmãos, esteve envolvido. Segue uma saudação fraterna aos comunistas mexicanos, para os quais toda a nossa militância professa o profundo sentimento de fraternidade típico de quem compartilha a mesma trincheira na luta sob as bandeiras do marxismo-leninismo e do internacionalismo proletário.

Algumas notas históricas que não devem ser esquecidas

Não é possível compreender a crise vivida no PCPE à parte da complexa história do movimento comunista espanhol. Tentar explicar o ocorrido abstraindo do quadro histórico em que se desencadeia o debate seria confundir a parte com o todo, como a rã que do fundo de um poço acha que o céu é a porção limitada dele que ela observa de seu local determinado.

O movimento comunista espanhol nasceu do impulso da Grande Revolução Socialista de Outubro como a Seção Espanhola da Internacional Comunista. Desde a fundação do primeiro Partido Comunista na Espanha em abril de 1920, até a constituição do Partido Comunista da Espanha em 14 de novembro de 1921, resultado do processo de fusão do Partido Comunista Espanhol e do Partido Comunista dos Trabalhadores, liderado pela Internacional. Portanto, nosso movimento comunista está inserido, por assim dizer, na tradição comunista.

Desde a fundação do Partido, nosso movimento foi construído em condições extremamente difíceis. Nossas mulheres e homens foram forçados pelos acontecimentos a aprender rapidamente como combinar as diferentes formas de luta usadas ao longo da história pelo movimento revolucionário. Assim, diante de inúmeras quedas e casos de repressão, embora gozando de breves períodos de legalidade, a maior parte da história do Partido até a legalização do PCE, em 7 de abril de 1977, ocorreu em condições de guerra e clandestinidade, nas formas de luta clandestinidade, luta armada regular e guerra de guerrilha. Portanto, à tradição cominterniana que marca nossa história, devemos acrescentar a característica de termos enfrentado diferentes condições de luta e de termos usado todas as formas de luta cunhadas pelo movimento operário revolucionário ao longo do tempo.

Outro dos traços determinantes da nossa história é a concretização prática, inserida na ação do Partido, de uma aplicação escrupulosa dos princípios do internacionalismo proletário. Assim, uma das primeiras tarefas práticas assumidas pelo Partido é a luta contra a guerra no Marrocos durante a Ditadura de Primo de Rivera. A Revolução de Outubro de 1934, que partiu de uma greve geral que deu origem a um processo insurrecional nas Astúrias, onde o proletariado veio a tomar o poder, gerou um amplo movimento de solidariedade internacional, que encontraria a sua continuidade ao longo do Biênio Negro (novembro de 1933 – fevereiro de 1936) com uma ampla campanha internacional exigindo a libertação dos prisioneiros de outubro e mostrando solidariedade às suas famílias.

Com o golpe de estado fascista de 18 de julho de 1936, o internacionalismo proletário atingiu uma nova etapa, tanto na Espanha quanto em escala mundial. À pronta solidariedade recebida da União Soviética somou-se aquele que é seguramente o maior expoente do internacionalismo ao longo da história: a formação das Brigadas Internacionais em outubro de 1936, por iniciativa da Internacional e dos Partidos Comunistas, que chegaram a recrutar cerca de 60.000 trabalhadores de cerca de 50 países, dispostos a apoiar o povo espanhol em nossa Guerra Nacional e Revolucionária contra o fascismo. Nós, comunistas espanhóis, jamais esqueceremos os voluntários pela liberdade, aqueles que, fundamentalmente armados de princípios, abandonaram sua pátria para vir defender a nossa, em cujo solo repousam os quase 15.000 camaradas internacionais mortos em combate. Também não esqueceremos o acolhimento e o apoio da União Soviética, do resto dos países socialistas e dos partidos comunistas irmãos durante a longa noite da ditadura fascista.

Por sua vez, os comunistas espanhóis participaram ativamente em diferentes frentes durante a Segunda Guerra Mundial, especialmente na Resistência Francesa e nas diferentes frentes daquela que foi a Guerra Patriótica travada pelo povo soviético, fator decisivo para a vitória antifascista.

Ressaltamos tudo isso para destacar alguns dos traços históricos do movimento comunista espanhol: a origem do Comintern, o internacionalismo proletário e uma história marcada pela combinação de diferentes formas de luta, das mais rudimentares às mais altas. E apontamos essas características porque, se podemos caracterizar por algo o grupo oportunista encabeçado por Carmelo Suárez, é justamente porque ele se afasta dessa tradição histórica, que, como veremos, está intimamente relacionada às condições em que o próprio PCPE nasceu e se desenvolveu.

O PCPE: um partido marcado por reagrupamentos e crises

Após a aprovação da política de reconciliação nacional, Santiago Carrillo assumiu o poder dentro do Partido Comunista da Espanha. O XX Congresso do PCUS será crucial neste processo, pois a viragem oportunista que nele se certifica oferece uma carta de índole a todas aquelas posições que, no seio de outros Partidos Comunistas e Operários, questionaram alguns dos princípios essenciais do internacionalismo proletário, o marxismo-leninismo e o centralismo democrático.

A militância comunista, porém, lutou contra o processo de degeneração revisionista e consequente liquidação do Partido. Como resultado dessa luta, diferentes grupos de oposição ao eurocomunismo foram organizados. Entre eles, o Partido Comunista da Catalunha, o Partido Comunista Unificado da Espanha, o Movimento para a Recuperação do PCE, o Movimento para a Reconstrução e Unificação do PCE e as Células Comunistas, participaram do Congresso de Unidade dos Comunistas, realizado em Madri de 13 a 15 de janeiro de 1984, do qual nasceria o Partido Comunista (PC). Em janeiro de 1986, após um processo legal solicitado pelo PCE, o Partido Comunista mudou seu nome para Partido Comunista dos Povos da Espanha.

O nascimento do PCPE é resultado de um processo de luta contra o eurocomunismo e de reagrupamento dos diferentes grupos que participaram do Congresso de Unidade dos Comunistas. A defesa da União Soviética, contra o virulento antissovietismo do PCE, foi um dos principais fatores da unidade comunista. Mas o novo Partido, que contou com o reconhecimento e a ajuda do PCUS desde a sua origem, nasceu sobrecarregado por uma série de fatores que condicionariam seriamente o seu desenvolvimento:

1. A ausência de um verdadeiro processo de unificação político-ideológica da sua militância, que foi substituída pelo recurso à negociação entre os dirigentes dos grupos que participaram no processo de unidade, muitas vezes às costas dos órgãos regulares do Partido e em detrimento do centralismo democrático.

2. A ausência de uma análise rigorosa das causas da derrota na guerra nacional-revolucionária e das condições em que o eurocomunismo poderia se tornar hegemônico dentro do PCE, com a participação muitas vezes acrítica dos primeiros dirigentes do PCPE, muito significativamente de Ignacio Gallego, seu primeiro secretário-geral.

3. A assunção acrítica das políticas aprovadas pelo PCUS, que levaram a assumir posições políticas próprias face à construção do socialismo que, na realidade, visavam precisamente desmantelar o poder dos trabalhadores e criar as condições para a contrarrevolução. Nesse sentido, destaca-se o apoio dado pelo PCPE desde os primórdios às políticas da Perestroika.

O Partido não estava política e ideologicamente preparado para enfrentar os desafios que se apresentariam muito em breve. A primeira delas, a fundação da Esquerda Unida, na qual, seguindo a então vigente política de “frente de esquerda” – que, como veremos em breve, o grupo de Carmelo Suárez está tentando recuperar – o PCPE participou ativamente. Como resultado deste processo de convergência, e sob a orientação da direção contrarrevolucionária do PCUS, Ignacio Gallego e a maioria do Comitê Central, juntamente com a maioria dos quadros e cargos institucionais e cerca de oito mil militantes, decidiram retornar ao PCE em janeiro de 1989.

O PCPE, chefiado por Juan Ramos, ficou seriamente debilitado, perdendo o apoio dos partidos no poder que o apoiavam desde a sua fundação, sendo posteriormente expulso da Esquerda Unida.

Em condições tão difíceis, o Partido enfrentou o triunfo contrarrevolucionário na União Soviética e nos países do campo socialista europeu, sofrendo inúmeras baixas e novos episódios de crise que perduraram ao longo da década de 1990. Às deficiências ideológicas anteriores somou-se o fato de que, nessas condições, o PCPE não teve forças para empreender a análise das causas que levaram ao triunfo temporário da contrarrevolução.

Durante a década de 1990, em condições de extrema fragilidade político-ideológica e organizacional, o Partido começou a perder a influência que ainda tinha dentro das Comissões Operárias, uma central sindical promovida pelos comunistas espanhóis que iniciou uma guinada acentuada à direita que terminou com a expulsão de centenas de comunistas confrontados com a deriva do sindicato que tão decisivamente contribuíram para organizar desde os tempos da clandestinidade.

Em suma, ao chegar o século XXI, o PCPE sofre as consequências de nunca ter concluído um verdadeiro processo de unificação organizacional, política e ideológica, vendo-se influenciado, política e ideologicamente, ao longo da década de 1990 e primeira década deste século, por todas as correntes de pensamento em voga: supostos intelectuais de esquerda, correntes nacionalistas de esquerda, movimentos de libertação nacional etc., coexistindo, dentro deles, posturas típicas do programa oficial do movimento comunista internacional, forjado a partir do Congresso do PCUS, marcado por um forte etapismo; com posições abertamente trotskistas – representadas no Comitê Central – e abertamente influenciadas em suas posições por posições estranhas ao marxismo-leninismo e abertamente opostas a ele.

Mas o Partido, apesar de tudo, conseguiu resistir e manter sua referencialidade como organização ancorada no marxismo-leninismo, como o Partido que representou as esperanças dos setores militantes contrários ao eurocomunismo, dos setores que enfrentaram o antissovietismo praticado pelo PCE, daqueles homens e mulheres que, apesar das difíceis condições em que tiveram que lutar, souberam encontrar forças para resistir ao duro golpe da contrarrevolução. E é precisamente esta referencialidade que permite ao PCPE voltar a ser protagonista de novos processos de reagrupamento desde os primeiros anos deste século.

Nomeado Carmelo Suárez Secretário-Geral, depois do VII Congresso Extraordinário, depois de ter demitido fracionalmente o camarada Juan Ramos, o Partido enfrentou uma nova crise que terminaria com o abandono da fiel militância a quem, apesar dos múltiplos e graves erros cometidos, havia sido Secretário General do Partido nos momentos mais difíceis da sua história. Mas, nessa ocasião, duas condições permitiram ao PCPE sair daquela crise com um fortalecimento geral: o processo de unidade com o PCOE, durante o ano 2000, que permitiu a entrada no Partido de quadros comunistas política e ideologicamente preparados e, pouco depois, a chegada de novos setores militantes que se formaram na década de 90 lutando pelo marxismo-leninismo, fundamentalmente dentro de um PCE que havia renunciado completamente às funções de qualquer partido político e, principalmente, às funções de partido intitulado comunista.

Começa uma nova etapa que levará ao IX Congresso

A direção encabeçada por Carmelo Suárez apresentará ao VIII Congresso do Partido (abril de 2006) algumas teses que, no fundo, propunham uma estratégia revolucionária por etapas. Primeiro, o Partido deveria forjar, aplicando a política de frente de esquerda, as condições para uma ampla mobilização popular que levasse à convocação de um processo constituinte que desembocasse na Terceira República, na forma de um Estado confederado. Nessas condições, com uma correlação de forças supostamente mais favorável, seria empreendida uma segunda etapa de luta que levaria à construção do socialismo na Espanha. Note-se que, na proposta inicial de teses parlamentares, inclusive se incluía inicialmente a formulação do “Socialismo do Século XXI”, mais especificamente na tese defendida por Julio Díaz, eterno número dois do grupo oportunista.

Nesse Congresso, estabeleceu-se uma dura luta político-ideológica que conseguiu derrotar os setores trotskistas que buscavam romper com a heróica história do PCE durante a Guerra Nacional e Revolucionária, e qualificar substancialmente a estratégia etapista, conseguindo introduzir o caráter ininterrupto da luta comunista, seguindo os ensinamentos de Lênin e, entre outras questões de importante alcance – na medida em que se confrontaram as posições trotskistas –, a vigência da lei do desenvolvimento político e econômico desigual no imperialismo, com expresso reconhecimento da possibilidade inicial de vitória do socialismo em um único país ou grupo de países.

Os setores que se enfrentaram no Congresso, seguindo o antigo costume do pacto entre as famílias, já cunhado nas origens do PCPE e cultivado por Carmelo Suárez, chegaram ao Comitê Central. Portanto, a luta continuou no próprio Comitê Central e, reflexivamente, no Partido como um todo. Os eixos principais do debate político-ideológico eram, no fundo, aqueles que acabariam por levar as contradições a se tornarem antagônicas:

– A concepção do marxismo-leninismo como ciência e cosmovisão proletária.

– O papel da classe trabalhadora no processo revolucionário e o papel do Partido no movimento operário.

– O modelo de Partido

– A teoria do imperialismo nas condições contemporâneas.

Marxismo-Leninismo versus Ecletismo

Em Três Fontes e Três Partes Integrais do Marxismo, Lênin apontou que “[a] doutrina de Marx é toda-poderosa porque é exata, dando aos homens uma concepção integral do mundo[1], intransigente com todas as superstições, com todas as reações e com toda defesa da opressão burguesa”.

A exatidão do marxismo de nosso tempo, isto é, do marxismo-leninismo, deriva do caráter científico de sua filosofia materialista dialética, de sua teoria econômica e da doutrina da luta de classes, do socialismo científico, que compõem a visão de mundo de a classe trabalhadora.

Sem teoria revolucionária não pode haver prática revolucionária e, no conjunto do movimento comunista espanhol, esta teoria sofreu e continua a sofrer um atraso notável como consequência geral da crise do movimento comunista internacional e, muito particularmente, da crise histórica condições em que se forjou o movimento revolucionário comunista na Espanha. Tudo isto fez com que nunca se analisassem sistematicamente as causas da derrota na Guerra Nacional Revolucionária nem as condições em que as teses do eurocomunismo se tornaram hegemônicas no PCE, para além de algumas tentativas pontuais e, em geral, de caráter individual. Por sua vez, e como já foi destacado, nos anos em que o PCPE nasceu e começou a se desenvolver, as teses revisionistas são absolutamente hegemônicas no PCUS, e o novo partido se limita a transferir para suas teses parlamentares, sem maiores análises, a estratégia estabelecida no movimento comunista internacional após o XX Congresso do PCUS.

A falta de desenvolvimento do marxismo-leninismo fez com que várias gerações de comunistas fossem formados no mais completo ecletismo, combinando pedacinhos da teoria marxista com as teorias em voga que, a todo momento, viriam trazer frescor aos ensinamentos do marxismo-leninismo que passaram a ser considerados como meros dogmas, como livros de receitas obsoletos, como catecismos ideológicos. Diante da total incapacidade de explicar a realidade a partir dos parâmetros do marxismo-leninismo, contribuindo para o seu desenvolvimento, muitos quadros viram-se influenciados por correntes que passaram a representar tais ou tais interesses de classe, alheios, na maioria das vezes, à classe trabalhadora. No caso do grupo Suárez-Díaz, três tendências influenciam fundamentalmente:

– As correntes da Nova Esquerda, que chegaram à Espanha na década de 1970, com a ascensão do eurocomunismo no PCE, influenciaram muitos militantes universitários da época, como Carmelo Suárez.

– As posições oficiais do PCUS desde 1984, incluindo o corpus teórico que tentou embasar a Perestroika, em que foram formados muitos quadros do PCPE enviados a países socialistas (o próprio Carmelo Suárez participou desse tipo de curso na Tchecoslováquia).

– As posições do movimento que se tornaram hegemônicas após o triunfo da contrarrevolução e, por fim, do pós-modernismo.

Portanto, uma das características do grupo Suárez-Díaz é sua completa heterogeneidade e ecletismo ideológico. Uma característica que, como aconteceu ao longo da história com todas as correntes oportunistas, as leva a confrontar e classificar como sectária ou dogmática qualquer posição baseada em uma concepção integral do desenvolvimento social e da luta de classes.

Esse ecletismo manifesta-se na prática habitual desse grupo de fazer passar por posições do Partido, ou por posições marxistas-leninistas, posições defendidas pelas mais diversas personalidades e mesmo posições abertamente hostis ao comunismo, recorrendo muitas vezes a um plágio grosseiro. Como prova desta prática permitimos-nos enumerar alguns casos recentes:

– Durante o debate sobre a questão da mulher, que o PCPE abordou em 2015, tentou-se transferir posições plagiadas, nunca citadas, de autoras como a argentina Ester Kandel, a brasileira Claudia Mazzei Nogueira, a italiana Silvia Federici.

– Durante os debates do X Congresso, a célula de Alexis Dorta (Responsável Ideológico do grupo Suárez-Díaz) apresentou ao Congresso propostas de emendas às teses plagiadas por David Harvey e Yann Cézard, este último militante do trotskista Novo Partido Anticapitalista francês.

– Na coluna de formação de Unidade e Luta, em relação à análise da crise capitalista, foram divulgadas posições plagiadas do líder trotskista Ernest Mandel, especificamente de seu livro As longas ondas do desenvolvimento capitalista. A interpretação marxista.

Este tipo de prática levou o grupo Suárez-Díaz a submeter à Revista Comunista Internacional um artigo sobre a Grande Revolução Socialista de Outubro que foi justamente questionado pelo Partido Comunista do México e outros partidos irmãos, ante cujas críticas o grupo Carmelo Suárez, em vez de enfrentar um debate ideológico aberto, preferiu retirar sua proposta antes que ela fosse criticada nas páginas da Revista.

Apesar da crise vivida no seio do PCPE e do questionamento de tais práticas numa polémica que adquiriu dimensão internacional, esse grupo eclético persiste sem a menor vergonha nas suas práticas ideológicas desonestas. Sem ir mais longe, sua contribuição ao Seminário Internacional Comemorativo da Grande Revolução Socialista de Outubro, realizado em 24 de junho em Caracas, no âmbito das atividades do XV Congresso do Partido Comunista da Venezuela, é em grande parte um plágio de a obra de Atilio A. Borón intitulada Atualidade do Que Fazer? De Lênin.

O papel da classe trabalhadora

Uma consequência inevitável do caráter ideológico do grupo Suárez-Díaz é sua vergonhosa negação do papel central e insubstituível da classe trabalhadora no processo revolucionário, que se materializou durante os debates do X Congresso em sua aberta e beligerante oposição às políticas de giro operário propostas nas teses do Comitê Central e finalmente aprovadas pelo plenário do Congresso.

Em suas análises, o Partido vinha confirmando sua baixíssima influência junto à classe trabalhadora, materializada em pouquíssimos índices de trabalho dentro dos sindicatos e na completa ausência de organizações partidárias nos locais de trabalho e setores produtivos. Esta realidade, refletida na composição classista do Partido e, especialmente, de seus órgãos de direção, é o que leva à formulação da política do giro operário – tão odiada por Carmelo Suárez –, colocando o proletariado no centro das atenções do trabalho do Partido e priorizando os planos que visam a ampliar a influência comunista dentro das organizações sindicais, direcionando a organização do Partido para o local de trabalho, sem negligenciar a atividade comunista nos locais de residência da classe.

Tais posições foram acusadas de serem obreiristas, especialmente por Julio Díaz. Nesse caso e novamente sem citar as fontes, como é de praxe neste grupo, basearam-se nas posições defendidas pelo filósofo italiano Doménico Losurdo em sua obra A luta de classes. A partir dos parâmetros manejados por Losurdo, ou melhor, de sua compreensão particular deles, qualificaram a política do giro operário como binária, propondo como alternativa uma abordagem pela qual o Partido basearia sua atividade em todas as colisões acessórias que o trabalhador ou trabalhadora se encontra em seu cotidiano, afastando-se da concepção de classe contra classe.

Esse aspecto ideológico do confronto com o grupo Suárez-Díaz adquire especial interesse, na medida em que revela seu caráter de classe. Sob a acusação de tentar reduzir a luta à esfera produtiva, ou de explicar todas as contradições sociais a partir do mais-valor, na realidade escondem posições manifestamente pequeno-burguesas. Primeiro, porque em sua abordagem todos os problemas sociais são abordados do ponto de vista do indivíduo e não da classe. Em segundo lugar, porque os diferentes problemas que cada indivíduo enfrenta em sua vida cotidiana são desvinculados da esfera da produção, são desvinculados do fato de que o conjunto das relações sociais decorre da propriedade privada capitalista dos meios de produção. Em terceiro lugar, porque separam o Partido da sua base de classe e expressam assim uma certa concepção do socialismo de natureza utópica e reformista.

Assim, as posições defendidas pelo grupo de Suárez-Díaz deslizam perigosamente para as teses pós-modernas em voga. Sob o pretexto de fugir de qualquer concepção binária, o principal torna-se secundário na ação do Partido, que deve atender aos aspectos parciais (sexualidade, aspectos ambientais etc.) com especial atenção se não quiser ser acusado de unilateralismo, obreirismo e dogmatismo. Portanto, a base sobre a qual o Partido deve se organizar é territorial, onde ocorrem essas colisões acessórias, onde se organizam os movimentos sociais nos quais o Partido, acima de tudo, deve estar presente.

O principal torna-se secundário, pois o essencial é atender aos diferentes problemas que setores da pequena burguesia colocam a cada momento. A classe trabalhadora é relegada, o movimento operário fica à mercê das direções reformistas dos sindicatos e da influência da velha e da nova socialdemocracia e o papel do Partido se limita a praticar um reboquismo estéril das lutas econômicas travadas pela classe trabalhadora, sem qualquer capacidade de liderança e, ainda por cima, aliado a um forte sectarismo que chega a acusar os trabalhadores em luta de não terem um nível superior de consciência de classe.

A partir dessas concepções, na realidade e para além das autoafirmações retóricas, o Partido deixa de ser de classe e se transforma em força pequeno-burguesa; o programa comunista deixa de responder aos interesses proletários e é substituído pelas preocupações, na maioria das vezes individuais, do pequeno-burguês da vez, autoelevado ao pedestal de dirigente comunista. As elaborações do Partido deixam de responder à ciência marxista-leninista e passam a ser plagiadas do autor da moda, da última leitura e/ou preocupação do dirigente de plantão. A contradição capital-trabalho é obscurecida, e a luta de massas e a própria concepção das massas são separadas de sua base de classe objetiva.

A política do giro operário, proposta pela maioria do Comitê Central e finalmente aprovada pelo X Congresso, parte do ensinamento leninista sobre a necessidade de considerar objetivamente o conjunto de relações mútuas entre todas as classes sociais de uma dada sociedade, para traçar a tática adequada; partindo de uma estratégia que aponta para a tomada do poder pela classe trabalhadora, através da Revolução Socialista, para a instauração da ditadura do proletariado e a construção do socialismo-comunismo na Espanha. Isso, para qualquer comunista, é impensável com um Partido com pouca influência e sem capacidade de liderança sobre o movimento operário e sindical, sem organizações nos principais locais de trabalho e, pelo menos, nos setores produtivos estratégicos.

Portanto, a luta contra as posições do grupo de Suárez-Díaz, radicalmente contrário a avançar neste caminho e disposto a obstruí-lo por todos os meios, adquire um claro caráter de classe como uma luta contra as influências pequeno-burguesas no movimento operário revolucionário.

O Partido de que precisamos

E, como não poderia deixar de ser, o conflito político-ideológico com o grupo de Carmelo Suárez se transfere também para a própria concepção do Partido, seu caráter e as formas de seu desenvolvimento organizativo, incorrendo nossos novos mencheviques em um imensa e tosca manipulação pequeno-burguesa das concepções leninistas em três aspectos intimamente relacionados: a profissionalização do Partido, a concepção do revolucionário profissional e o processo de bolchevização.

Como explicamos, o avanço das posições leninistas contemporâneas dentro do Partido colocou na mesa o debate sobre a necessidade de bolchevizar o Partido, entendendo por bolchevização a implementação de um processo que vise erradicar as deficiências e converter o PCPE em um Partido preparado lutar em todas as condições e empregar corretamente todas as formas de luta.

Para a dupla Suárez-Díaz, a palavra de ordem da bolchevização logo se tornou um modismo e, como todos os modismos, perdeu o conteúdo e tornou-se mera retórica. A qualquer observador imparcial pareceria impensável, ou mera demagogia, tentar conduzir um processo revolucionário sem um aparato profissional, sem um único quadro dedicado o tempo inteiro às tarefas revolucionárias, sem um mínimo de financiamento que ultrapasse a cotização militante e com um secretário-geral residente em uma ilha localizada a quase dois mil quilômetros da capital do país.

Pois bem, por mais ridículo que pareça, esse assunto também virou campo de batalha com o grupo de Carmelo Suárez, que a esse respeito acusava as forças comunistas que tentavam avançar no sentido de superar o predomínio absoluto do trabalho artesanal dentro do PCPE de conceber o Partido como uma máquina burocrática ou estabelecer metas inatingíveis. A esse respeito, bastaria lembrar as gloriosas palavras de Lênin em Que fazer?: “Não tenham medo, senhores! Lembre-se que em termos de organização estamos em um patamar tão baixo que a ideia de que podemos subir muito alto é absurda!” Porém, é preciso aprofundar um pouco mais a questão, pois ela também esconde um claro caráter de classe.

Para qualquer leninista é evidente que todo Partido deve tender a ter o maior número de quadros profissionais, que nas palavras de Lênin não só dedicam as suas tardes livres à Revolução, assim como é evidente que a militância comunista, acorrentada à produção capitalista por um mínimo de oito horas por dia, deve concentrar seus esforços prioritários em fazer o trabalho comunista no local de trabalho, transformando-o em um bastião do Partido Comunista. Portanto, o Partido deve fornecer os meios para converter seus quadros principais em revolucionários profissionais, dedicando todo o seu tempo ao desenvolvimento do Partido e da luta revolucionária.

Somente com uma organização de revolucionários profissionais é possível organizar uma revolução. Agora, como Carmelo Suárez entende o revolucionário profissional? Ele entende como uma pessoa que dedica toda a sua vida à revolução, algo com o qual, em princípio, qualquer um pode concordar; mas se esquece de libertar o quadro revolucionário do trabalho assalariado, se esquece de sua verdadeira profissionalização. Assim, desvinculando-se da realidade material em que vive a classe trabalhadora – à qual não pertence –, incorre em um subjetivismo atroz. Quem pode se tornar o militante comunista ideal sem se separar da produção, sem se profissionalizar? Quadros pequeno-burgueses que têm um trabalho profissional em que podem dispor livremente do seu tempo – não vendido à classe dominante – e organizar, aqui, o seu tempo livre para o cumprimento de tarefas militantes. E quem pode ser líder? Pois bem, quem, para além desse tempo livre, tenha meios de subsistência suficientes para pagar as inúmeras deslocações, pernoites e sustento que o trabalho de gestão implica.

Como se vê, o modelo partidário baseado no pacto fracional entre as famílias corresponde a um ecletismo ideológico, com a despriorização e centralização do trabalho, com uma política de movimento que relega o trabalho para o movimento operário, com o culto ao trabalho artesanal e, finalmente, com o domínio da pequena burguesia no Partido.

Imperialismo: estágio superior do capitalismo ou política externa das potências imperialistas?

Durante a década de 1990, o campo da solidariedade internacionalista foi o principal refúgio de muitos quadros comunistas na Espanha. Amplos setores da militância comunista, em plena perplexidade com o triunfo da contrarrevolução na União Soviética, fizeram do movimento solidário sua principal frente de trabalho.

A solidariedade com a Revolução Cubana, que se recusava a abaixar as bandeiras do socialismo e se preparava para enfrentar o “período especial em tempos de paz” sob condições de cerco imperialista, tornou-se foco de resistência política e ideológica da militância comunista em nosso país. A defesa de Cuba socialista tornou-se um elemento que definiu o campo entre os que, no calor da onda contrarrevolucionária, se preparavam para a rendição e os que se mantiveram firmes em seus princípios. A resistência da Revolução Socialista em Cuba teve a virtude de unir temporariamente as lutas de ontem com as lutas do presente e do futuro, como elemento de continuidade histórica entre as revoluções socialistas do século XX e as do futuro.

As mudanças na correlação de forças que operavam na América Latina, após a vitória de Hugo Chávez em 1999 e o posterior desenvolvimento do processo venezuelano, introduziram novas chaves para o movimento de solidariedade, fortalecido pelas sucessivas vitórias eleitorais de forças progressistas e socialdemocratas em alguns países latino-americanos. As posições que falam de socialismo sem revolução começaram a se espalhar.

Ao mesmo tempo, o que viria a ser chamado de movimento antiglobalização começou a se desenvolver com intensidade, a partir da Cúpula da OMC realizada em Seattle em novembro de 1999, com especial repercussão em vários países europeus, entre eles a Espanha. Esse movimento teria um maior desenvolvimento a partir da convocação do Fórum Social Mundial em Porto Alegre, no ano de 2001.

Esses processos de mobilização, profundamente interligados e cuja análise extrapola o objetivo deste artigo, terão clara repercussão ideológica em diversos Partidos Comunistas e, principalmente, no próprio PCPE, que, como se viu, partiu de algumas características particulares em sua formação político-ideológica. De uma forma ou de outra, posições como as defendidas por Toni Negri e Michael Hardt, em sua obra Império, penetraram nas fileiras comunistas, que, em nome de um suposto pós-marxismo, passaram a enfrentar abertamente a teoria leninista do imperialismo, em terreno já previamente explorado por muitas das teses defendidas pelo zapatismo em matéria internacional, desde o levante de 1º de janeiro de 1994, e pela necessidade de enfrentar a agressão estadunidense por parte dos governos progressistas dos países latino-americanos. Essas posições ideológicas, com a existência de nuances óbvias, continuaram com as teses sobre o socialismo do século XXI e com sua concretização na política e na teoria da multipolaridade, em um cenário internacional marcado pela força dos BRICS.

O estudo do desenvolvimento do sistema imperialista, o papel dos estados capitalistas e sua posição na cadeia imperialista como única forma de delinear a estratégia e a tática revolucionárias foram deixados de lado. A teoria leninista sobre o imperialismo como fase superior e última do imperialismo perdeu influência dentro do PCPE, além de certas referências formais ou meramente retóricas e em seu lugar foram importadas algumas das teorias da moda que, como já foi visto, uma vez feita a demarcação dentro do Partido, persistem e se aprofundam com os comprovados e variados plágios do grupo Suárez-Díaz.

E precisamente neste campo, no da concepção do imperialismo, parte da batalha ideológica se travou dentro do PCPE como resultado dos novos desenvolvimentos no cenário internacional: entre nós que sustentamos que o imperialismo é uma fase concreta do desenvolvimento do capitalismo, caracterizado pelos cinco traços apontados em sua época por Lênin, e entre o grupo de Suárez-Díaz, muitos de seus quadros confundem o imperialismo com a política externa agressiva de certas potências capitalistas, especialmente dos Estados Unidos.

Profundamente influenciados por diferentes correntes de pensamento em voga, desconhecem em suas análises o fator determinante da interdependência desigual entre os diferentes elos da cadeia imperialista, ignoram o grau de socialização da produção e do trabalho e, por fim, acabam negando na prática que se, na época de Lênin o imperialismo era considerado o prelúdio da revolução proletária, em nossos dias, para qualquer marxista-leninista consistente, este ponto não oferece a menor discussão.

Este erro de análise, consequência de um profundo desconhecimento do marxismo-leninismo e de seu ecletismo ideológico, tem graves consequências políticas. A primeira delas é a negação prática de que vivemos na era da transição do capitalismo ao socialismo, portanto o objetivo do Partido Comunista é a luta pela derrubada do capitalismo, conforme aprovado em sua época pelo IX Congresso da PCPE, que levou ao abandono da estratégia por fases, e conforme ratificado pelo X Congresso do Partido. Essa negação, que, como já foi dito, decorre de um distanciamento da teoria leninista do imperialismo, leva-os inevitavelmente à defesa política das formas de gestão do capitalismo em oposição à política externa dos Estados Unidos, à defesa – como um caminho para o socialismo – de governos burgueses “progressistas” frente a um imperialismo que se reduz, cada vez mais, ao imperialismo ianque.

Separam a política de sua base econômica na análise do imperialismo e, com isso, consciente ou inconscientemente, tornam-se o suporte das potências capitalistas que disputam a liderança dos Estados Unidos na pirâmide imperialista, convocam a classe trabalhadora para lutar sob a bandeira estrangeira na cena das contradições interimperialistas, relegando o objetivo da revolução socialista e, assim, afetando séria e negativamente a essencial independência de classe do proletariado; o que, por fim, leva a uma nova defesa de uma estratégia por etapas, levantando ilusoriamente a possibilidade de que os governos capitalistas recuperem ou conquistem certos graus de independência dentro do sistema imperialista (novamente a suposta etapa de libertação nacional).

O problema não permanece meramente teórico, mas tem um claro impacto prático. Como exemplo, basta apontar que esse tipo de análise levou membros do grupo Suárez-Díaz a participar de uma manifestação em Barcelona em frente ao Consulado da Federação Russa para agradecer ao Governo de Vladimir Putin por sua intervenção militar na guerra na Síria. Como se vê, o abandono do marxismo-leninismo acaba por, finalmente, tomar lado no campo das contradições interimperialistas e apoiar a potência menos pior, defendendo com a maior hipocrisia que ele desempenha um papel anti-imperialista.

Na base deste debate está a recusa constante do grupo de Suárez-Díaz em fazer uma análise aprofundada das causas da contrarrevolução na União Soviética e no resto dos países que construíam o socialismo na Europa Central e Oriental; sua recusa em analisar rigorosamente a história do comunismo espanhol, apontando autocriticamente os erros cometidos; sua recusa em aprofundar a proposta socialista-comunista para a Espanha, as leis que regem a construção do socialismo e sua compatibilidade ou não com as relações comerciais e a lei do valor; em sua recusa em aprofundar a análise da hegemonia das relações capitalistas de produção na República Popular da China e suas consequências internas e internacionais etc.

Em suma, o grupo Suárez-Díaz se caracteriza por sua recusa em analisar os fenômenos que atualmente marcam a luta de classes desde o marxismo-leninismo, que eles contrabandearam plagiando posições alheias, com base em um ecletismo desavergonhado, negando o desenvolvimento contemporâneo do socialismo científico. O leninismo torna-se um cachorro morto, uma mera bandeira a ser hasteada de forma fetichista ou no calor de meros interesses e cálculos oportunistas.

Repercussões no Movimento Comunista Internacional

Tais posições passam inevitavelmente para o campo do movimento comunista internacional, exibindo um aventureirismo delirante, uma irresponsabilidade extremamente perigosa e um oportunismo crescente do grupo liderado por Carmelo Suárez.

Como é público e notório, no seio do PCPE decorreram numerosos debates que conduziram à clarificação da estratégia revolucionária, do modelo do Partido e da nossa posição no movimento comunista internacional, a partir, sobretudo, dos debates do IX Congresso. Como não poderia deixar de ser, os debates no seio do movimento comunista espanhol não ficam alheios aos existentes internacionalmente, estando o PCPE integrado nos partidos que promoveram a Revista Comunista Internacional e a Iniciativa Europeia dos Partidos Comunistas e Operários, convertida em primeira meta a ser vencida pelo grupo Suárez-Díaz.

Como se tornou público, antes da demarcação dentro do PCPE, o Secretário Ideológico do grupo Suárez-Díaz apresentou um artigo ao número 7 da Revista Comunista Internacional que foi ocultado do Comitê Central do Partido. Este artigo, que continha graves desvios, foi justamente criticado pelo Partido Comunista do México e pelos representantes de outros partidos cujas revistas participam do RCI, que, devido aos canais orgânicos aprovados na Declaração de Istambul e suas modificações posteriores, optaram por publicar suas críticas no espaço da Revista dedicado a esse fim. O grupo Díaz-Suárez, além de pressionar para tentar impedir que qualquer observação crítica fosse publicada, decidiu retirar o artigo, justificando daí seu giro ideológico por meio de toda uma série de provocações públicas contra os partidos da Revista Comunista Internacional, e muito significativamente contra o PCM e o KKE.

A segunda esfera em que este grupo oportunista decide lançar suas provocações é a da Iniciativa Europeia de Partidos Comunistas e Operários. Em 7 de maio, a Iniciativa convocou um evento em Berlim sob o lema “9 de maio, 72 anos da Grande Vitória Antifascista dos Povos: Estamos inspirados e continuamos a luta contra a distorção da história pela UE e pelo capital. Pela derrubada do podre sistema capitalista que gera a crise, as guerras, o fascismo”. Nesta atividade, que decorreu poucos dias depois da rutura no PCPE, o Secretariado da Iniciativa decidiu admitir uma dupla representação dos comunistas espanhóis, de forma responsável e tendo em conta as condições especiais que existiam no PCPE. Os dois representantes do grupo Suárez-Díaz que se deslocaram a Berlim, numa atitude claramente provocadora, não participaram em nenhum momento do programa conjunto em que participaram os delegados dos partidos presentes, deixando de comparecer, inclusive, à oferenda floral da Iniciativa em frente ao Monumento Soviético no Parque Treptower, onde repousam os restos mortais de milhares de soldados do Exército Vermelho que deram suas vidas na batalha de Berlim durante os meses de abril e maio de 1945. Eles só apareceram nos minutos antes da celebração do ato público para exigir que Julio Díaz fosse o único representante espanhol no evento, que por sua atitude começou com notável atraso. Como foi tornado público, esta demanda não foi aceita pelos outros partidos da Iniciativa, então Julio Díaz e seu companheiro deixaram o local sem participar das atividades antifascistas.

E novamente se intensificam com as provocações a partir do XV Congresso do Partido Comunista da Venezuela realizado em junho passado em Caracas, onde Carmelo Suárez propõe uma declaração de solidariedade com a Venezuela que, longe de tentar unificar o apoio comunista internacional ao Partido Comunista da Venezuela, visa principalmente a dividir os partidos presentes com dois objetivos: buscar algum reconhecimento internacional para seu grupo e, em segundo lugar, encontrar um novo argumento para continuar sua campanha internacional de ataque e difamação contra partidos como o PC do México ou o KKE.

Como ficou evidente poucos dias depois do Congresso do PCV, e como vem acontecendo desde a crise ocorrida no V Plenário de nosso Comitê Central, o grupo Suárez-Díaz busca inimigos externos para esconder, fundamentalmente entre suas próprias fileiras, o debate sobre as causas profundas que levaram à sua saída do PCPE.

Apesar de vários partidos presentes no Congresso do PCV não terem subscrito a Declaração proposta por Carmelo Suárez – que, aliás, introduz elementos político-ideológicos que foram criticamente abordados neste sentido – só os partidos mexicano e grego receberam ataques furiosos do grupo Suárez-Díaz, que foram devidamente respondidos por ambos.

Com a atitude demonstrada no cenário internacional pelo grupo Suárez-Díaz, que pretende “culpar” sua falência política e ideológica a uma delirante conspiração internacional, fica mais uma vez demonstrado o autêntico caráter oportunista de seus principais dirigentes, que durante anos fingiram cultivar relações de irmandade e camaradagem com o PCM e o KKE com o único objetivo de buscar o reconhecimento internacional contra o PCE, e não com base em posições político-ideológicas, estratégias e táticas revolucionárias e análise compartilhada das causas da crise do movimento comunista internacional.

Ao dobrar sua aposta, tentando encobrir seus erros acusando infundadamente outros partidos irmãos, eles estão cometendo uma tremenda irresponsabilidade. Não só porque suas calúnias são usadas politicamente pelos oportunistas mexicanos e gregos para atacar nossos partidos irmãos, mas também porque eles estão tentando cindir o movimento comunista internacional.

O PCPE tem sido claro em todos os debates internacionais do nosso movimento nos últimos anos e nossa posição continua firme: reconhecemos a crise em que o movimento comunista internacional está imerso, defendemos que os avanços devem ser feitos com base no reforço do caráter marxista-leninista dos partidos comunistas e operários, e por isso estamos dispostos a enfrentar todos os debates necessários, desde a camaradagem e respeito pelo quadro de actuação de cada partido irmão.

A calúnia, a manipulação e a difamação são as armas dos oportunistas e traidores, nunca as bases sobre as quais um movimento comunista internacional possa se consolidar no auge que o momento histórico nos exige.

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